domingo, 30 de novembro de 2014

Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP): guerra de preços contra produtores norte-americanos

29/11/2014, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Países membros da OPEP
A reunião da OPEP em Viena na 5ª-feira (27/11/2014) foi como divisor de águas, no ir e vir da maré da política de energia. A Arábia Saudita expôs ali, sem meias palavras, a decisão de que não haverá qualquer corte na produção para deter a acentuada queda nos preços do petróleo. Ouviram-se vozes discordantes, mas na OPEP os sauditas mandam e desmandam.

Será o raiar de uma “nova ordem do petróleo”? Os sauditas distribuíram notícias de que a OPEP está realmente em guerra aberta contra os produtores norte-americanos de petróleo de xisto, e de que é guerra necessária, para que se preservem as fatias de mercado dos países reunidos na OPEP.

Mas, privadamente, os sauditas já informam que todos tratem de aprender a viver com menor renda por um ano ou dois, e que se agarrem com unhas e dentes à própria fatia de mercado. Mas nem todos estão convencidos de que a posição dos sauditas seja autêntica.

Reunião da OPEP em Viena, Áustria - 27/11/2014
Há mérito na posição dos sauditas, na medida que já se constatou grande mudança no mercado global de petróleo nos anos recentes. Se o forte aumento nos preços do petróleo em meados dos anos 2000 (graças a forte aumento na demanda global) galvanizou a busca por novas fontes, e eventualmente levou ao uso das revolucionárias tecnologias do fracking e da perfuração horizontal, para extrair petróleo de “formações de xisto” nos EUA, o salto na produção gera a ameaça de crise de excesso de oferta.

Somada ao enfraquecimento da demanda por petróleo na Europa (Alemanha) e Ásia (China e Japão), só a produção adicional dos EUA (4 milhões de barris/dia) significa aumento substancial na oferta (antes baseada em 75 milhões de barris/dia). Além disso, houve aumento na produção de petróleo também no Canadá e na Rússia, e a Líbia está de volta aos negócios, depois da caótica “mudança de regime” pela qual o país passou.


Essencialmente, a OPEP (saudita) decidiu deixar o preço cair a um preço tal que os projetos de perfuração de altíssimo custo em curso nos EUA sintam que a nova produção é antieconômica e sejam forçados a desistir.
Abdalla Salem El-Badri, Secretário Geral da OPEP

É gambito de alto risco, porque ninguém sabe, com certeza, qual o ponto a partir do qual a extração de petróleo de xisto tornar-se-á “não lucrativa”.

Na verdade, a combinação de demanda mais fraca e oferta crescente fez o preço cair de US$ 115/barril em meados de junho, para US$ 80/barril em meados de novembro. Depois da reunião da OPEP na 5ª-feira (27/11/2014), os preços literalmente desabaram. O Brent cru está agora em torno de US$ 70/barril.

Claramente, a influência da OPEP sobre o mercado mundial de petróleo já não é hoje a mesma de antes, historicamente. Até o presente, a OPEP (que produz hoje 40% do petróleo do mundo) podia “controlar” efetivamente o preço mundial do petróleo pelo método simples de coordenar cortes (ou picos positivos) na produção. Já não é o caso.

Produziremos 30 milhões de barris/dia nos próximos seis meses, e veremos como se comportam os mercados.

Assim o secretário-geral da OPEP, Abdalla El-Badri comentou o resultado da reunião de 5ª-feira (27/11/2014) em Viena. Em resumo, há à vista uma nova era no mecanismo de fazer preço para o petróleo, na qual o próprio mercado administrará a oferta, não mais a OPEP.

Preços de petróleo até 2040, previsão (EIA -EUA) 
(Clique na imagem para aumentar)
Enquanto isso, para todos os efeitos práticos, a OPEP declarou guerra aos perfuradores norte-americanos de xisto, com os EUA como novo “produtor duvidoso” [orig. swing producer]. O impacto de tudo isso na política mundial não pode ser mais profundo. Se o mundo estava dividido entre países produtores e países consumidores de petróleo, os países consumidores serão os grandes ganhadores.

A queda nos preços do petróleo para US$ 70 ou abaixo disso por barril é como ganhar a sorte grande para aquelas economias e entre elas estão a União Europeia, China, Japão e Índia. A conta a pagar por petróleo importado da Índia, ano passado, chegou a US$135 bilhões. A economia é muito substancial.

Moscou deu-se por parte prejudicada, com EUA e Irã, os principais perdedores ante a queda nos preços do petróleo. Mas a história não acaba aí. Moscou parece ter interesses comuns com a Arábia Saudita, como país produtor interessado em desalojar do mercado o petróleo de xisto dos norte-americanos.

Interessante: o Ministro de Relações Exteriores da Arábia Saudita, Faisal Al-Saud, visitou Moscou apenas uma semana antes da reunião da OPEP, e os dois países concordaram amplamente com a abordagem saudita a ser divulgada, como foi, na reunião da OPEP.

Sergey Lavrov em 22/11/2014
Como o Ministro de Relações Exteriores da Rússia Sergey Lavrov disse depois das conversações com o ministro saudita,

(...) quando países exportadores de petróleo veem desequilíbrio entre oferta e demanda, quando veem que a oferta ou a demanda está sendo artificialmente manipulada por atores particulares no mercado, é claro que têm o direito de tomar medidas que visem a corrigir aqueles fatores não objetivos, para devolver o mercado à sua posição natural.

Mais uma vez, a queda nos preços do petróleo teria variados impactos também na China. O ponto é que se sabe que a China tem as maiores reservas do mundo de gás de xisto. Atualmente está às voltas com a extração – o que pode mudar, se a tecnologia norte-americana for acessível.

A assinatura do recente acordo entre China e os EUA pode dar o ímpeto de que os dois lados carecem para cooperar na extração do petróleo de xisto.

Extraindo petróleo de xisto em West Virginia, EUA
Mas, feitas todas as contas, a atitude dos sauditas, de desafio, é jogada arriscada. Com certeza é mais barato bombear petróleo na Arábia Saudita, que extrair petróleo de solos de xisto no Texas ou Dakota do Norte. Em princípio, claro, se o preço do petróleo continuar a cair, pode acontecer de os produtores norte-americanos fugirem do negócio – com o que os preços do petróleo se estabilizarão e a OPEP manterá sua fatia de 40% do mercado.

O caso é que ninguém sabe qual terá de ser o preço do petróleo no mercado mundial, para que o boom do xisto realmente fracasse. A Agência Internacional de Energia só sabe que cerca de 4% dos projetos de xisto dos EUA podem ruir, se o preço do petróleo cair abaixo de US$ 80/barril. Por outro lado, muitos projetos na formação Bakken em Dakota do Norte permanecerão nos negócios, a menos que os preços do petróleo caiam abaixo de US$ 42/barril (o que é impensável).


Será longa jornada noite adentro até junho/2015, quando deve acontecer a próxima reunião da OPEP.
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[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Oriente Médio, Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de geopolítica, de energia e de segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu e Ásia Times Online, Al Jazeera, Counterpunch, Information Clearing House, e muita outras. Anima o blog Indian Punchline no sítio Rediff BLOGS. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala, Índia.

Dois meses de ataques aéreos da “coalizão” dos EUA; e o ISIS/ISIL “não está mais fraco”

29/11/2014, [*] Tyler Durden, Zero Hedge
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Mais guerras à distância e mais e mais sanções resolvem tuuuuuudo! [Pano rápido]

Walid al-Mouallem, MRE da Síria
Apesar de todos os esforços da coalizão comandada pelos EUA, o Estado Islâmico continua a fortalecer-se. Essa a constrangedora mensagem que os propagandistas pró-EUA levaram pela cara, vinda de ninguém menos, em matéria de coturnos-em-solo, que o Ministro de Relações Exteriores da Síria, Walid al-Mouallem. “Todas as indicações dizem que [o Estado Islâmico] hoje, depois de dois meses de ataques aéreos pela coalizão, não está mais fraco” – repetiu Walid al-Mouallem, na comparação que fazia entre os esforços militares da “coalizão” e a sugestão, encaminhada pelos russos, para que se reinicie o processo político entre Damasco e “a oposição síria construtiva”. Convenhamos: essa não é, com certeza, mensagem que o ocidente quer que o mundo ouça...

Como Sputnik News noticia,

Embora a coalizão comandada pelos EUA já tenha conduzido cerca de 300 ataques aéreos na Síria desde setembro, ela visivelmente não teve sucesso no esforço para enfraquecer o Estado Islâmico, disse o ministro de Relações Exteriores da Síria, Walid al-Mouallem.

“Todas as indicações mostram que [o Estado Islâmico] hoje, depois de dois meses de ataques aéreos pela coalizão, não está mais fraco”, disse Walid al-Mouallem, em entrevista à rede Al Mayadeen TV, que tem sede em Beirute, citado pela Agência Reuters.

O Ministro de Relações Exteriores da Síria destacou que os terroristas não serão totalmente destruídos, a menos que a Turquia mantenha controle estrito sobre suas fronteiras com a Síria.

“Se o Conselho de Segurança e Washington não forçarem a Turquia a controlar suas fronteiras, nem toda a ação [da coalizão dos EUA] eliminará [o Estado Islâmico], disse Mouallem, chamando a atenção para o fato de que jihadistas estrangeiros continuam a entrar na Síria pela fronteira com a Turquia, que se estende por mais de 900 km. A Turquia, contudo “negou veementemente acusações de que teria apoiado militantes islamistas, inadvertidamente ou de outros modos, no seu entusiasmo para ajudar rebeldes sírios a derrubar Assad” – como se lê no Guardian.

...

Na entrevista (trecho acima) à rede de TV RT, Mouallem disse que, enquanto continuar a haver interferência vinda de fora da Síria, representada pelas ações da coalizão internacional e pelo fluxo de terroristas que cruzam as fronteiras sírias, não será possível estabelecer qualquer diálogo interno entre os lados em conflito na Síria.

O ministro acrescentou que o maior problema para a Síria agora é a conspiração contra ela pelos países vizinhos, incluindo Turquia, Arábia Saudita, Qatar, Jordânia e outros. Disse que a interferência externa nos assuntos sírios impede a desescalada da crise.

O ministro sírio explicou que essa é a razão pela qual os russos, amigos da síria, entendem que o diálogo interno da Síria seja mais útil que o diálogo realizado antes, em Genebra.


Fronteira entre Síria e Turquia

[*] Tyler Durden é o apelido de numerosos blogueiros que comentam no Zero Hedge. O nome foi copiado de personagem do romance de Chuck Palahniuk (depois filme) Fight Club (Clube de Luta).

Pepe Escobar: Acordo nuclear com Irã entra na zona de perigo

25/11/2014, [*] Pepe EscobarRT – Russia Today
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

(Da esq. p/ a Dir) John Kerry, Philip Hammond, Sergei Lavrov, Javad Zarif, Frank-Walter Steinmeier, Laurent Fabius, Catherine Ashton e Wang Yi. Viena 24/11/1014).
No final, um acordo nuclear com o Irã foi abortado em Viena? É bom sinal? Ou melhor todos começarmos a rezar – e correr à procura de abrigo?

Os atores – o Irã e os P5+1 (os cinco membros permanentes do CS-ONU mais a Alemanha) – não só perderam o prazo final marcado para 24 de novembro de 2014; agora apareceram com dois novos prazos: um, dia 1º de março de 2015, para definir um etéreo “acordo de contexto” [orig. “framework agreement”]; e o segundo, em teoria, dia 1º de julho de 2015, para assinar o acordo final.

O P5+1 e o Irã estão negociando conforme o Plano de Ação Conjunta de novembro de 2013, em Genebra – que determina que se congelem alguns aspectos do programa nuclear iraniano, em troca do fim das sanções, mas só de algumas sanções, não de todas. Afinal, algumas daquelas sanções ilegais absolutamente nada têm a ver com o programa nuclear iraniano, e têm de ser levantadas pelo Congresso dos EUA.

Em termos geopolíticos, sete meses é uma eternidade. Os diplomatas iranianos esforçaram-se por não dar sinais de desânimo, insistindo em que o adiamento pode ser mal menor, considerando que não houve nem escalada retórica nem novas sanções.

Mas fato é que são mais sete meses em que as negociações permanecem expostas ao fogo aberto dos suspeitos (radicais) de sempre, os quais, em Washington são legião (todos os Republicanos, muitos Democratas, neoconservadores, os lobbies israelense e saudita, os setores chaves do complexo industrial militar).

Irã - Usina nuclear de Bushehr
Enquanto isso, no Irã, o comandante do Corpo dos Guardas Revolucionários Islâmicos [orig. Islamic Revolutionary Guards Corps (IRGC), general Mohammad Ali Jafari, e o comandante das milícias Basiji, general Mohammad Reza Nagdi, criticaram não só as próprias negociações, mas também algumas das nações P5+1.

O que deu errado?

Os pontos chaves em discussão permanecem: quantas centrífugas o Irã poderá operar; a duração do acordo (o Irã aceita no máximo cinco anos; os EUA querem mais de dez); e o cronograma crucial para o levantamento das sanções (o Irã quer o fim de todas as sanções – das impostas pela ONU, pelos EUA e pela União Europeia – imediatamente; os EUA insistem em processo gradual e lento).

O objetivo chave também permanece: em primeiro lugar, a normalização entre Irã e EUA (o Muro de Desconfianças, que já completou 35 anos e lá continua), e também com a União Europeia. As relações entre Irã e Rússia/China são excelentes.

Pode-se bem argumentar que todo esse interminável drama é não problema, em primeiro lugar, porque o Irã – como até o festival de siglas das agências de inteligência dos EUA admitem – não tem programa de armas nucleares; Teerã usa o enriquecimento nuclear civil para gerar eletricidade.

O governo Obama passa a impressão de que o Irã pode ser “autorizado” a manter um programa nuclear civil que não possa ser convertido para finalidades militares, o que é propagandeado pelos EUA como gesto de bondade.

Imprensa-empresa ocidental

Mas não faz sentido algum que as recentes negociações em Omã e depois em Viena, culminando com sete ministros de Relações Exteriores discutindo na mesma sala, não tenham chegado a se acertar sobre qualquer detalhe, mesmo com a discussão já posta em linguagem palatável para a opinião pública em cada país.

Em Omã, para resolver a controvérsia das centrífugas, a Rússia ofereceu-se para guardar a maior parte do estoque iraniano de urânio processado. Foi remix de uma ideia ventilada há cinco anos. Moscou fez isso para viabilizar o atendimento às – justas – demandas de Teerã, combinado à promessa de que o programa nuclear iraniano poderia prosseguir.

Então, obviamente, os negociadores iranianos usaram a oferta russa para induzir Washington a ser mais realista. Já era então bem claro que Teerã não sacrificaria nenhum de seus direitos para obter algum acordo – baseada só numa vaga promessa de alívio em algumas das sanções.

Afinal, mês passado, o Líder Supremo Aiatolá Khamenei já havia publicado a lista de 11 itens da “linha vermelha” de Teerã. São os pontos não negociáveis – e a lista inclui o direito de manter o programa nuclear civil de pesquisas, e o direito de enriquecer urânio para finalidades civis.

Observadores bem posicionados em Teerã destacam que o presidente Rouhani é moderado de meio do caminho, que não venderá – ou não o deixarão vender – ao Tio Sam, a economia iraniana. Um daqueles observadores disse-me que:

Rouhani tem controle do que está acontecendo na economia; conseguiu controlar a inflação galopante. Em termos de reconciliação com o grande Satã, o chefe não permitirá que Rouhani faça qualquer acomodação à custa da segurança econômica, cultural e nacional, e dos direitos nacionais.

Fato é que algo saiu errado no domingo (23/11/2014), em Viena. Pela manhã, todos os atores falavam sobre detalhes finais, depois que vazou a informação de que mais de 90% do acordo estaria acertado. Então, ao final da tarde, começaram as “notícias”, nos EUA, de que haveria uma “extensão” no prazo das conversações.

Imprensa-empresa no Irã

Ninguém até agora vazou qualquer informação sobre o que matou o acordo, no último instante. Forte possibilidade é que tenha aparecido alguma “nova” demanda pelos EUA, e que nada teve a ver com a questão nuclear (há precedentes). Por exemplo, podem ter exigido, como nova condição para firmar o acordo, que o Irã suspenda o apoio que dá ao Hezbollah – concessão iraniana que poderia ser útil ao governo Obama, para vender o acordo em Washington.

No Capitólio, alerta vermelho

O que é certo é que quando os Republicanos assumirem o controle do Senado dos EUA em janeiro, será como o inferno se abrir. Todos e quaisquer aspectos de qualquer possível acordo serão incansavelmente bombardeados – porque a meta assumirá o corpo de um monstro bicéfalo: demonizar o Irã e, ao mesmo tempo, impedir que Obama, em final de mandato, obtenha uma vitória que seria a única, na política exterior, de seus dois mandatos como presidente.

Um mini-inferno já aconteceu, depois que vazou a carta que Obama escreveu a Khamenei sobre a possibilidade de uma cooperação não militar EUA-Irã, para lutar contra o Estado Islâmico (Daesh/ISIS/ISIL). A extrema direita norte-americana sempre verá Teerã como entidade “diabólica” que odeia Israel, apoia o Hezbollah, e al-Assad na Síria e que, portanto, merece sofrer mudança de regime.

Implica que o governo Obama já perdeu em Viena a última janela de oportunidades para fechar acordo seu. Se o Capitólio for bem sucedido na primeira metade de 2015 – e não se pouparão esforços! – fato é que a assustadora possibilidade-ameaça de ataque ao Irã estará de volta à mesa de negociações, se não durante o ocaso do governo Obama e durante a campanha eleitoral ao longo de 2016, com certeza quando a presidente-na-sala-de-espera Hillary Clinton assumir.

Integração Irã - Rússia - China
O Irã, é claro, não esperará sentado. Comércio, integração financeira e militar com ambas, Rússia e China, serão muito acelerados (para grande lástima de vastos interesses comerciais do ocidente). O Irã já encontrou um modo de escapar às sanções para exportar produtos de petróleo para China, Japão e Coreia do Sul. E Teerã e Moscou já acertaram todos os detalhes genéricos para um negócio de US$ 20 bilhões, de troca de petróleo por outros produtos.

Além de tudo isso, a “economia de resistência”, como Khamenei definiu-a para o Irã, continuará a descobrir novas vias para driblar o bloqueio financeiro – feroz e, mais uma vez, ilegal – que os EUA impuseram ao Irã.

Teerã sabe exatamente o que quer: preservar seu programa nuclear – direito do Irã, nos termos do Tratado de Não Proliferação, de que o país é signatário – e livrar-se por bem, do sórdido regime de sanções. Mas... e o que quer o governo Obama?

Mesmo considerando a lastimável confusão que é a doutrina de política exterior de Obama, que o próprio autor definiu como “Não faça merda coisa estúpida”, é justo assumir que Obama aceitará esfriar o caldeirão entre Irã e Arábia Saudita, sem tentar alterar o equilíbrio de poder.

E é aí que a coisa fica realmente saborosa: esse “esfriamento” no Oriente Médio permitirá que Washington redirecione as suas pegadas militares contra (e contra quem seria?!) Rússia e China. Verdade é que, e considerando a aterradora mediocridade da turma do “Não faça merda coisa estúpida”, a coisa aí permanece no campo do wishful thinking, puro delírio desejante.
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[*] Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna (The Roving Eye) no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como: Tom Dispatch, Information Clearing HouseRed Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia TodayThe Real News Network Televison e Al-Jazeera. Seus artigos podem ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu e João Aroldo, no blog redecastorphoto.
Livros:
− Obama Does Globalistan, Nimble Books, 2009.
− Seu novo livro, Empire of Chaos, acaba de ser publicado pela Nimble Books.

sábado, 29 de novembro de 2014

Obama: só placebo, na violência contra as liberdades civis


27/11/2014, [*] Wayne MADSENStrategic Culture
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


O policial Wilson atirou várias vezes contra Brown, inclusive um tiro mortal na testa, porque se sentiu “ameaçado” por um negro jovem desarmado. Nas palavras do próprio Wilson: “O único modo que encontro para descrever é... como um demônio, de tão furioso que aquilo parecia!”, referindo-se a Brown. Reencontrado com os tempos da escravidão, Wilson, como tantos dos seus apoiadores racistas, veem os negros como “coisas”. Por isso disse “aquilo”, falando de um homem.


Michael Brown desarmado e assassinado...
Pelo estado policial dos EUA! 
Barack Obama operou como placebo na situação de erosão continuada das liberdades civis nos EUA. O governo que chegou a ser antecipado como o “mais transparente” da história dos EUA, acabou sendo o mais opaco, com Obama processando número maior de funcionários públicos por violação da Lei Antiespionagem de 1917, que todos os seus antecessores somados. Os que estão sendo processados são pressupostos “criminosos” por terem informado jornalistas sobre os malfeitos e crimes do próprio governo de Obama.

Obama também foi propagandeado como o primeiro presidente afro-americano dos EUA ‘pós-racismo’. Em vez disso, o primeiro mandato de Obama assistiu à volta dos EUA aos tempos sinistros dos EUA de Jim Crow, quando adultos jovens e adolescentes negros correm alto risco de morrerem baleados na rua – ou de serem espancados até a morte – por policiais brancos racistas. Esses EUA apareceram à vista de todos, quando um Tribunal Federal no Condado de St. Louis, Missouri, absolveu o policial Darren Wilson, de Ferguson, que matou a tiros um jovem negro de 18 anos, Michael Brown. Wilson disse ao tribunal que Brown, que media 1,93m de altura, “parecia um demônio”, quando Wilson, que também mede 1,93m, o encontrou, numa batida policial que, como adiante se viu, nada absolutamente teve de normal.

Darren Wilson, o policial assassino
Wilson atirou várias vezes contra Brown, inclusive um tiro mortal na testa, porque se sentiu “ameaçado” por um negro jovem desarmado. Nas palavras do próprio Wilson:

O único modo que encontro para descrever é... como um demônio, de tão furioso que aquilo parecia... − referindo-se a Brown.

Reencontrado com os tempos da escravidão, Wilson, como tantos dos seus apoiadores racistas, veem os negros como ‘'coisas'’. Por isso disse “aquilo”, falando de um homem.

Não se deve esquecer que no debate presidencial em 2008 com o então candidato Obama, o senador John McCain apontou para Obama, no palco e disse “aquele ali”, referindo-se ao adversário.

Quando atirou em Brown, Wilson sabia que o “sistema” se ergueria a seu favor. Raramente oficiais de polícia são condenados por assassinato ou crime doloso. É o que se chama “paredão azul” [referência à cor dos uniformes dos policiais], de policiais, advogados, procuradores, juízes de um lado; e os cidadãos, do lado oposto. Na verdade, Wilson lucrou bastante, pessoalmente, por ter assassinado Brown. Ele leiloou a primeira entrevista depois de absolvido, entre vários “jornalistas” de uma “mídia” que salivava, e pode ter acertado na roleta, se forem verdadeiros os insistentes boatos segundo os quais a rede ABC News, que pertence aos estúdios Disney, comprou, por gorda quantia de seis dígitos, os direitos àquela primeira entrevista da “celebridade”, depois de absolvido.

Robert McCulloch, o promotor que "acusou"
o assassino...
Em vez de questionar os jurados que lá estavam no tribunal de St. Louis County, o procurador Robert McCulloch, nascido em família de policiais; cujo pai foi morto em serviço por um negro, e que tem longa história de mentir em tribunais, decidiu só apresentar “provas” que apresentavam o “acusado” sob a luz mais favorável. Fotos de supostos “ferimentos” que Wilson teria recebido foram distribuídas para os jurados, embora parecessem, de fato, microcortes autoinfligidos com navalha, pelo próprio Wilson, ao barbear-se. Nenhuma das testemunhas que assistiram aos tiros foi interrogada. Na verdade, as declarações desse procurador à mídia, ao informar os jornalistas sobre a absolvição, incluíam várias referências a testemunhas que mudaram seus depoimentos ante o juiz. McCulloch parecia culpar mais a imprensa que Wilson, pela reação que o assassinato de Brown provocou nos EUA.

Em vez de enfrentar um estado policial nos EUA, cujos procuradores de Justiça e senadores são autorizados a desqualificar os cidadãos negros e mestiços, Obama delicia-se agora antecipando a luxuosa aposentadoria de ex-presidente que o espera.

Obama nada fez para mudar o curso e restaurar os direitos constitucionais dos norte-americanos, ou para livrá-los de serem perpetuamente vigiados pela Agência de Segurança Nacional, FBITransportation Security Administration e centenas de agências e departamentos pelo país. As polícias locais e até as escolas públicas já são armadas com equipamento militar potencialmente letal, fornecido pelo Departamento de Defesa para ser usado por civis para autodefesa. São rifles de assalto, morteiros, veículos blindados e granadas de mão.

A segunda morte de Michael Brown...
Memorial incendiado!
A empresa-imprensa só fala da agitação e das depredações em Ferguson, que começaram depois da decisão do tribunal. Houve sugestões de que as polícias estadual e local saíssem de cena contra os provocadores de ações violentas. Assim o governador do Missouri, Jay Nixon, encontrou pretexto para convocar a Guarda Nacional do Missouri para restabelecer a ordem nas ruas. Os EUA de Obama, pelo menos para quem leia jornais, parecem os EUA dos anos 1970s: Nixon ordena deslocamento de mais soldados da Guarda Nacional.

Zeid Ra’ad Al Hussein
O Departamento de Estado dos EUA edita “relatório” anual da situação dos Direitos Humanos pelo mundo. O relatório cobre todos os direitos, dos direitos de gays, a questões de antissemitismo. Contudo, por mais que se procure, não se encontra no tal “relatório” nenhuma referência ao maior violador de direitos humanos no planeta – os EUA.

Depois da decisão do tribunal do Missouri que absolveu Wilson da acusação de assassinato doloso e também da acusação de assassinato sem intenção de matar, outro policial, em Cleveland, matou um menino afro-americano de 12 anos que carregava uma arma de brinquedo.

O Alto Comissário da ONU para Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, acusou os EUA por violação sistemática dos direitos humanos de afro-americanos e de outras minorias. Disse que em muitos setores da população dos EUA, há “profunda e crescente desconfiança contra os sistemas de distribuição e de aplicação da lei e da justiça”.

Konstantin Dolgov, Comissário no Ministério de Relações Exteriores da Rússia para Direitos Humanos, Democracia e Estado de Direito, escreveu pelo Twitter: “

Konstantin Dolgov
Continuam a crescer as tensões étnicas na sociedade norte-americana. É hora de as autoridades norte-americanas darem atenção ao que se passa por lá, em vez de tanto se ocuparem com aplicar sermões ao resto do mundo, sobre direitos humanos.

O ministro de Relações Exteriores do Egito, antes, pedira que os EUA mostrassem contenção e moderação, no modo de enfrentar as manifestações de rua em Ferguson. Porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China também conclamou os EUA a melhorarem seus registros no campo dos direitos humanos. A China tem sido alvo de insistentes “protestos”, por autoridades norte-americanas, por causa de políticas chinesas para os direitos humanos.

O único fator que nunca muda nos repetidos fracassos dos EUA no campo dos direitos humanos, como se comprova com os assassinatos de civis na área de St. Louis, em Cleveland, em New York e em outras cidades, é que os EUA recusam-se sempre a reconhecer que vivem uma catástrofe humanitária no campo das liberdades civis, o que faz do país alvo de condenações, ao mesmo tempo em que as autoridades norte-americanas, ensandecidamente, só fazem apresentar os EUA como exemplo a seguir, para todo o mundo.

Enquanto Ferguson queimava e soldados da Guarda Nacional eram mandados para o condado de St. Louis, Obama decidiu mudar-se para território familiar, em Chicago, onde começou sua carreira política. O dito “organizador comunitário” e “ativista social” foi vaiado por manifestantes em sua própria cidade, quando tentava inflar sua nova política para a imigração.

Obama surdo?
Obama sempre foi seletivamente surdo para todas as reclamações de norte-americanos médios, fosse um adolescente negro em ambiente racista, como em Ferguson, Missouri ou Sanford, Florida, ou um operário que vive de salário mínimo e não pode pagar para receber a assistência médica do “Obamacare”.

Obama meteu-se em golpes para “mudança de regime” na Ucrânia, na Síria, na Líbia, no Egito, na Tunísia e em outros países, ao mesmo tempo em que só frustrou os clamores legítimos por mudança de regime ali dentro dos EUA, em Ferguson, no estado do Missouri, em Cleveland, Detroit, Oakland e em outras cidades.

Para os EUA, o slogan de campanha de Obama “Esperança e Mudança” converteu-se em piada macabra, com Obama sempre rindo para o lado de Wall Street, já antevendo a luxuosa aposentadoria que o espera, enquanto embolsa as gordas doações que lhe fazem empresas agradecidas, para os seus Museu e Biblioteca Presidenciais Barack Obama.
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[*] Wayne Madsen é jornalista investigativo, autor e colunista. Tem cerca de vinte anos de experiência em questões de segurança. Como oficial da ativa projetou um dos primeiros programas de segurança de computadores para a Marinha dos EUA. Tem sido comentarista frequente da política de segurança nacional na Fox News e também nas redes ABC, NBC, CBS, PBS, CNN, BBC, Al JazeeraStrategic Culture e MS-NBC. Foi convidado a depor como testemunha perante a Câmara dos Deputados dos EUA, o Tribunal Penal da ONU para Ruanda, e num painel de investigação de terrorismo do governo francês. É membro da Sociedade de Jornalistas Profissionais (SPJ) e do National Press Club. Reside em Washington, DC.