quarta-feira, 14 de maio de 2014

Eis como Karl Rove trabalha

13/5/2014, [*] George Zornick, The Nation
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Fato é que, se não existissem jornais, nem jornalistas nem jornalismos da imprensa-empresa do capital, como os conhecemos, não existiriam karlsroves. E assim, sem canalhas do tipo “jornalístico” e sem canalhas do tipo “marqueteiro... A democracia até que teria alguma chance de prestar, n’ é-não?
Dê uma chance à democracia! DESCONECTE-SE do falso jornalismo do Grupo GAFE (Globo-Abril-FSP-Estadão)!

Karl Rove 
foto: Steve Helber
Se você leu o noticiário político na 3ª-feira (13/5/2014) nos EUA, com certeza você foi “informado” de que Karl Rove, ex-guru político de George W. Bush, sugeriu, numa conferência semana passada, que Hillary Clinton sofrera recentemente um “acidente vascular cerebral traumático”.

Rove imediatamente negou que tivesse dito o que disse; disse ao Washington Post horas mais tarde, no mesmo dia, que “é claro que ela não sofreu dano cerebral algum”.

Chris Cillizza
Mas a ideia de que a ex-primeira dama e possível candidata à presidência dos EUA tenha sido vítima de acidente vascular cerebral, já estava, sim, espalhada e implantada em todos os veículos da imprensa-empresa nos EUA. No mesmo Post, páginas adiante, já havia mais de mil palavras do sempre crédulo Chris Cillizza sobre a saúde da Clinton, a partir da frase de Rove. (Cillizza não está completamente convencido de que Rove tenha errado. De fato, começou a sentença com “deixando de lado o debate sobre o dano cerebral da candidata, que parece pura provocação...”).

Você pode até creditar na negativa de Rove – mas, para tanto, você terá de ignorar praticamente todos os dias de seu longo currículo “político”. Ao longo de décadas, Rove só fez pôr em circulação rumores pessoais sobre candidatos adversários de quem o estivesse pagando em cada campanha, sempre pondo os adversários sob luz adversa, na conversação social, ao mesmo tempo em que encobria as próprias pegadas e impressões digitais. De um ponto em diante, o boato passava a ser problema do candidato adversário, não mais do “jornalista’”que reproduzira a “notícia” que Rove criava, nem, e menos ainda, era problema de Rove. Esse truque aparece na página n. 1 de seu manual de truques “de marketing de campanha”.

Tome por exemplo o caso de Mark Kennedy, candidato dos Democratas à Suprema Corte do Alabama em 1994, e que apareceu recontada no livro de James Moore e Wayne Slater sobre Rove, The Architect [O arquiteto]. Rove estava trabalhando para Harold See, Republicano e professor na Faculdade de Direito, apoiado pelo Conselho Empresarial do Alabama.

Kennedy não era “o típico macho-do-Alabama, bebedor de cerveja, mascador de fumo, aquele tipo de cara que dirige a própria pick-up”. “É pequeno, bem vestido, bem educado, homem de família” – escrevem Moore e Slater. Traço central da campanha de Kennedy, era a organização que ele criara, privada, sem finalidades de lucro, para dar atendimento a crianças e famílias vítimas de abusos e de maus tratos.

Aparentemente, item perfeitamente “seguro” de currículo, a ser oferecido aos eleitores. Mas, como Moore e Slater anotam, Kennedy “não tinha nem ideia do que seria concorrer em eleições, contra Karl Rove”.  Eis o que aconteceu:

Mark Kennedy
De repente, não se sabe como, começou a circular pelas redes informais da Faculdade de Direito da Universidade de Alabama, e entre grupos e organizações de alunos, que Kennedy seria pedófilo. A campanha de difamação cresceu com eficácia perfeita e cruel, de dentro dos muros da faculdade de Direito, para as ruas, das ruas para as grandes cidades, das grandes cidades para as pequenas comunidades do Alabama, onde viviam e circulavam os alunos. [Um marqueteiro do comitê eleitoral de Kennedy] disse que ouvira aquelas mentiras de amigos, dentro da faculdade de Direito, e, quando estudou os números de pesquisa, percebeu que estavam funcionando. Mas, o que se poderia fazer?

Kennedy absolutamente não podia convocar uma conferência de imprensa, para anunciar que não era pedófilo – o que todos entenderam perfeitamente. Kennedy perdeu a eleição.

Rove é mestre na perversão de forçar os adversários a ter de dar conta de boatos que ferem a reputação pessoal, mesmo que, em primeiro lugar, sempre tenham sido boatos falsos, mentiras absolutamente criadas na própria cabeça do marqueteiro-jornalista. A lista de movimentos desse tipo é longuíssima. Aqui, apenas uma pequena amostra [No original, em inglês, tem uma terceira amostra cuja tradução é desnecessária (Nrc)] :

• Durante a campanha presidencial de 2000, quando Rove trabalhava para Bush, a campanha “passou a repetir amplamente o boato segundo o qual John McCain, torturado quando prisioneiro de guerra no Vietnã traíra os EUA sob interrogatório e recebera ferimentos que o tornavam mentalmente incapaz para operar como Senador dos EUA”.

Ann Richards
• Quando Bush concorria contra Ann Richards para o governo do Texas em 1994, circulou persistentemente o boato segundo o qual quem elegesse a governadora Richards “deveria estar preparado para conviver com gabinete formado exclusivamente de lésbicas”. Na sequência, um coordenador de campanha regional de Bush várias vezes criticou a candidata Richards por “nomear ativistas homossexuais assumidas” para o serviço público estadual. [...]

Agora, é sempre a mesma estratégia, refinada nos anos posteriores. (Observem os ecos entre o ataque contra a instabilidade mental de McCain, e, semana passada, a história sobre o acidente vascular cerebral que teria acometido a candidata Clinton).

Daqui em diante, é questão de tempo, até que algum jornalista pergunte a Clinton se ela sofreu ou não algum tipo de “dano cerebral”. Não importa qual seja, a resposta que ela dê reporá o assunto em circulação, e legiões de eleitores continuarão a “discutir” a “questão’ do “dano cerebral”. É e continuará a ser obra de Karl Rove, o homem – jornalista & marqueteiro de aluguel – que nunca, jamais, em toda a sua vida, recebeu um único, único, solitário voto, um, que fosse, em eleição democrática...
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[*] George Zornick cresceu em Buffalo, NY e bacharelou-se em Inglês na State University of New York na própria cidade onde viveu, Buffalo. Antes de juntar-se à equipe do The Nation foi reporter senior e blogueiro no sítio ThinkProgress.org. Trabalhou como pesquisador para Michael Moore no premiado documentário SICKO e foi produtor associado do Independent Film Channel. Seus artigos tem sido publicados também no The Los Angeles Times, Media Matters e The Buffalo News.

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