sexta-feira, 11 de outubro de 2013

EUA-Irã versus Israel: neoconservadores em desespero

9/10/2013, [*] Jim Lobe, Information Clearing House
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Netanyahu e a imaginária bomba iraniana
WASHINGTON – A semana passada começou com furiosa denúncia, pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu de Israel, do que seria “a hipocrisia” iraniana; e terminou com probabilidade ainda menor de que Israel venha a atacar as capacidades nucleares do Irã. “Os israelenses estão hoje na pior posição, em muitos anos” – concluiu Elliott Abrams, prestigiado neoconservador que foi o principal conselheiro de George W Bush para o Oriente Médio, em artigo da revista Foreign Affairs.
Embora Israel sempre possa atacar, por iniciativa sua, as instalações nucleares do Irã,
(...) sua capacidade para fazê-lo já foi consideravelmente reduzida pelo “reaquecimento” diplomático entre o Irã e os EUA – escreveu Abrams. – Uma coisa é bombardear o Irã quando o país se mostra irrecuperavelmente recalcitrante e isolado; outra coisa bem diferente é bombardeá-lo quando boa parte do mundo, especialmente os EUA, mostra-se otimista sobre as possibilidades das conversações.
A avaliação de Abrams é partilhada por seus parceiros ideológicos que entendem que Israel será a principal perdedora, se as esperanças de uma détente entre Washington e Teerã ganharem força depois da reunião da próxima semana em Genebra entre o Irã e o P5+1 (EUA, Grã-Bretanha, França, Rússia e China, mais a Alemanha).
Michael Makovsky
A revista neoconservadora Weekly Standard descreveu como “solitária” a posição de Israel (o editorial da semana passada levava o título de “Standing Alone”), embora o editor-chefe William Kristol e o diretor do Instituto Judeu de Assuntos de Segurança Nacional, Michael Makovsky, tenham assumido tom muito mais declarado de desafio, que Abrams. Conclamaram Netanyahu a avançar nas recentes ameaças de atacar instalações nucleares do Irã, com ou sem a aprovação dos EUA.
Ninguém gosta de ouvir a verdade no campo da pacificação” – escreveram. Para eles, o presidente Obama e seu “desejo rendido, quase desesperado, de obter algum acordo [nuclear], qualquer acordo” com o Irã implicariam uma espécie de “fracasso ocidental, um colapso da vontade”, o mesmo que o ex-ministro britânico Winston Churchill lamentou, no surgimento dos nazistas alemães, nos anos 1930s.
Em tom semelhante, o principal colunista de assuntos externos do Wall Street Journal, Bret Stephens, também lamentou amargamente a situação a que Israel se via reduzida, depois do tour de force do presidente Hassan Rouhani do Irã, na ONU, na semana anterior.
Bret Stephens
Israel está hoje na desastrosa posição de ter de esperar que os linha-duras iranianos sabotem os esforços de Rouhani para negociar algum acordo – escreveu ele, pouco antes de Netanyahu subir à tribuna para denunciar a perfídia de Teerã.
O líder israelense, lamentou Stephens, já cedeu demais aos esforços diplomáticos de Obama, quando não atacou o Irã no ano passado. Dado que Washington agora se retira do mundo – o que teria ficado evidentemente comprovado quando os EUA fracassaram nas ameaças de atacar a Síria –os israelenses devem agora rebaixar as relações com Washington, o colunista exigiu; e devem agir sem levar em consideração o cronograma diplomático de Obama.
Gary Sick, especialista em Irã que trabalhou no Conselho de Segurança Nacional nos governos Ford, Carter e Reagan, disse à agência InterPress Service que as recentes manifestação dos neoconservadores, de desafio e desespero, são
(...) a prova mais convincente que vi até hoje, de que os sabotadores mais empenhados de qualquer acordo entre EUA e Irã entraram em operação defensiva.
Marcos diplomáticos
Mohammad Javad Zarif
A apenas uma semana de o ministro iraniano de Relações Exteriores, Javad Zarif sentar-se para negociar com os seus interlocutores do P5+1 em Genebra, Netanyahu e seus apoiadores em Washington vivem ambiente diplomático e político profundamente diferente do que havia há apenas cinco semanas.
Esse ambiente é definido e modelado, sobretudo, pela opinião do eleitorado norte-americano, já farto de guerras, que aparece claramente no apoio da opinião pública à decisão de Obama a favor da diplomacia, não dos mísseis, para neutralizar o arsenal sírio de armas químicas.
O fato de que o processo de desarmamento até agora transcorre muito mais suavemente do que se havia previsto desacredita ainda mais os neoconservadores, que se opuseram furiosamente ao acordo EUA-Rússia que tornou possível aquele processo e que muito falaram a favor de ataque unilateral à Síria e do apoio aos “rebeldes”, hoje cada dia mais controlados por radicais islamistas.
A impressão muito favorável que Rouhani causou nos quatro dias de blitz diplomática em New York em setembro, que culminou com o telefonema absolutamente sem precedentes de Obama, [1] criou expectativas não só de um acordo sobre o programa nuclear do Irã, mas, também, de uma possível aproximação entre os dois países, depois de 34 anos de mútua demonização.
Elliott Abrams
Em seu artigo, Abrams concedeu que a exigência de Netanyahu, de que qualquer acordo nuclear deveria impor que o Irã abandonasse completamente seu programa nuclear, já não é realista; e que teria de ser abandonada, se passasse a depender da ação de sabotagem pelos linha-duras iranianos.
Netanyahu está impondo precondições a um acordo nuclear que são muito mais duras do que as condições que o governo Obama considera negociáveis e as quais, portanto, não estão sequer sendo consideradas – escreveu Abrams.
O líder israelense deve, pois, preparar-se para aceitar um programa com limite de 3,5% de enriquecimento do urânio e número limitado de centrífugas que o Irã poderia manter, além de limites também de estoque de urânio enriquecido. E deve-se prever que as sanções sejam suavizadas nos próximos meses, mas, diz Abrams, sob a condição inegociável de que o Irã cumpra o acordo.
Enquanto isso, argumenta Abrams, ecoando a poderosa Comissão EUA-Israel de Assuntos Públicos [orig. American Israel Public Affairs Committee, AIPAC], que o Congresso dos EUA, onde o lobby israelense exerce sua maior influência, deve garantir que as sanções sejam mantidas. Mas mesmo essa já é concessão que a elite da política exterior considera a mais provável, nas negociações.
Como já antecipado na coluna de domingo no Washington Post, por David Ignatius, os elementos básicos do acordo exigirão que o Irã “limite o nível de enriquecimento de urânio (a, digamos, 5%) e seus estoques de material enriquecido” a níveis suficientemente baixos, de modo que, se Teerã “entrar em surto de produzir a bomba”, EUA e Israel preservem meses de “alerta estratégico”.
Em troca, o ocidente levantaria as sanções e aceitaria “os direitos iranianos, em princípio, ao enriquecimento”, segundo Ignatius, cujas opiniões muito frequentemente reproduzem o pensamento do establishment político.
David Ignatius
Segundo Ignatius, o engajamento de Washington com a Rússia, na questão síria e na questão nuclear iraniana, oferece “grande oportunidade estratégica” que os críticos erram ao ver como “sinais de fraqueza dos EUA ou, até, de capitulação”.
Os EUA estarão mais fortes se puderem criar um quadro de segurança no Oriente Médio que envolva o Irã e dilua a ameaça do conflito sectário entre sunitas e xiitas que ameaça a região” e que “acomode as necessidades de segurança de iranianos, sauditas, israelenses, russos e norte-americanos”.
Mas precisamente essa é a acomodação considerada anátema por Netanyahu e seus apoiadores neoconservadores, que insistem em assegurar uma posição de privilégio para Israel no Oriente Médio e calculam a oposição ao Irã por uma equação de soma-zero, em relação à qual não admitem qualquer concessão.

Nota dos tradutores
[1] Ver, sobre isso, redecastorphoto, MK Bhadrakumar, 1/10/2013, Putin ganhou a Síria, Obama muda-se para o Irã, Asia Times Online, em português. 
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[*] Jim Lobe (nascido em 4 de janeiro de 1949, em Seattle, Washington) é um jornalista americano e o chefe do escritório de Washington da IPS -Inter Press Service. Trabalhou na Foreign Policy In Focus, na Oneworld.net, na Alternet, em TomPaine.com, no Asia Times e outras publicações de notícias de internet. Lobe é mais conhecido por sua crítica da política externa dos EUA, ao militarismo americano, crítico do anti-semitismo, com especial destaque na crítica aos neo-conservadores, sua visão de mundo, sua relação com outras tendências políticas e sua influência na administração Bush.

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