quarta-feira, 22 de maio de 2013

Pepe Escobar: “E o vencedor é... Khamenei”


23/5/2013, Pepe Escobar, Asia Times Online – The Roving Eye
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Pepe Escobar
Entreouvido na Vila Vudu: Pela primeira vez, em anos, houve veto, na nossa Roda de Conversa, contra traduzirmos artigo de Pepe Escobar – nossa unanimidade mais longeva, até ontem inabalada.  
O argumento que instruiu o veto da Zefa foi:

Ma ke porra de negócio é esse, agora, de escrever como se o Irã estivesse cometendo algum crime, por não ser nem querer ser “democracia” à moda do williamwaack?!

Melhor Khamenei – uma muraaaaalha na Resistência contra os EUA e Israel – que qualquer porra de “reformista” here, there and everywhere.

Zefa (Malalai Joya)
(E se o porra de reformista for “jovem”, chegado ao mundo quando o neoliberalismo já havia sido “naturalizado”, então, pior ainda, sô!). Queria o quê, o Pepinho Querido?! Queria que, numa briga desstamanhão, como a briga em que o Supremo Líder tá metido, contra EUA e Israel inteirinhos, ele deixasse os panacas do dedo verde udenista metidos a éticos, a laicos e a democráticos à moda williamwaack fazer o que quisessem?
É claro que não podia deixá! A revolução não é um piquenique.

Dado que nós não somos democráticos, nós traduzimos – porque o Elói quis traduzir; e registramos, apoiando integralmente, por unanimidade, o veto da Zefa.

Irã, 686 candidatos a candidatos à presidência nas eleições de 14/6/2013
Nada será deixado ao acaso. – Não se verá sequer algum tênue sinal de onda de protesto dos dedos verdes.

Em 2009, 475 candidatos registraram-se para concorrer à presidência do Irã. Só quatro foram aprovados pelo Conselho dos Guardiões – o todo-poderoso comitê de clérigos, com poder para revisar leis. Esse ano, nada menos que 686 registraram-se para concorrer às eleições de 14 de junho próximo. Foram aprovados oito.

Dentre os aprovados, não aparecem os dois pré-candidatos realmente controversos. Estão fora o ex-presidente Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, codinome “O Tubarão” – na essência, conservador pragmático – e Esfandiar Rahim Mashaei, conselheiro e braço direito do presidente que sai, Mahmud Ahmadinejad.

Os que competirão nas urnas não são exatamente grandes estrelas: Mohammad Reza Aref, ex-vice-presidente; Hassan Rowhani, ex-chefe da segurança nacional; Mohammad Gharazi ex-ministro das telecomunicações; Saeed Jalili, secretário do Conselho Supremo da Segurança Nacional do Irã; Mohammad Bagher Qalibaf, prefeito de Teerã; Ali Akbar Velayati, conselheiro do Supremo Líder Aiatolá Khamenei para questões de política externa; Mohsen Rezaei, secretário do Conselho dos Experientes; e Gholam-Ali Haddad-Adel, presidente do Parlamento. Mas aí está, sim, uma espécie de lista ‘'quem é quem'’ dos agregados do núcleo mais central da República Islâmica – os chamados “principistas”.

Os oito candidatos à Presidência do Irã escolhidos pelo Conselho dos Guardiões
Tubarão fora d’água

Segundo o ministério do Interior, O Tubarão está fora de jogo, por causa da idade avançada (78). Não é bem assim. O Tubarão está fora porque era o principal nome dos moderados – já catalizando o apoio de muitos reformistas (excluídos).

Esfandiar Rahim Mashaei
Mashaei está fora porque representaria uma continuação de Ahmadinejad – apoiado por vários ministros do gabinete de Ahmadinejad e beneficiado por uma formidável máquina política populista que ainda seduz os iranianos pobres nas cidades e no interior do país. Faria avançar o movimento de Ahmadinejad a favor de Executivo independente. Nada é coisa consumada – ainda. Embora nem Rafsanjani nem Mashaei possam apelar, o Supremo Líder em pessoa pode dar uma mãozinha. Mas é pouco provável que dê.

Rafsanjani esperou até o último dia, 11 de maio, para registrar sua candidatura a candidato. O ex-presidente Khatami – afamado pelo “diálogo de civilizações” – não se registrou e, um dia antes de esgotado o prazo, anunciou seu apoio a Rafsanjani. Pode-se facilmente adivinhar que soaram sinos de alarme no aprisco do Supremo Líder.

Ali Akbar Hashemi Rafsanjani
O Tubarão foi recentemente confirmado presidente do poderoso Conselho dos Experientes – que supervisiona o governo (Khamenei ocupava o mesmo posto, enquanto viveu o Aiatolá Khomeini). Pode ser interpretado como uma espécie de prêmio de consolação.

Ahmadinejad, por sua vez, deu sinais de estar disposto a fazer chantagem – ameaçou cuspir todos os feijões de corrupção dentro da família do Supremo Líder, de que tem conhecimento. Ahmadinejad que não espere qualquer favor.

Aiatolá Khamenei
Assumindo que o Supremo Líder permaneça imóvel, ele próprio e seus subordinados em toda a elite política conservadora expuseram-se a grave risco – o risco decorrente de terem alienado completamente duas facções políticas muito significativas na República Islâmica. Mas, até as eleições, o Conselho dos Guardiãos já terá desimpedido o caminho para garantir vitória fácil a Qalibaf, ex-comandante da Força Aérea dos Guardas Revolucionários e atual prefeito de Teerã.

Qalibaf seria o mais perfeito veículo, politicamente correto, para o que tenho descrito desde 2009 como a ditadura militar do mulariato – a dominação, pelo Corpo dos Guardas Revolucionários Islâmicos e clérigos conservadores, sob o comando do único que realmente decide, o Supremo Líder Khamenei, de toda a vida institucional no Irã.

Mohammad Bagher Ghalibaf
Matéria publicada em al-Monitor  faz referência a um lado nada gentil, de Qalibaf. O fato em si não surpreende. Infinitamente mais crucial é a questão sobre se Khamenei e os ultraconservadores conseguirão manter-se preservados numa torre de marfim, enquanto deteriora-se a situação econômica interna, e um altissonante eixo árabe sunita – amplamente instigado pelos EUA e apoiado por Israel – já late às portas do Irã.

Vote! Se não...

Nas próximas eleições, o Supremo Líder precisa muitíssimo de grande número de votos, para impulsionar a legitimidade do sistema. Por isso, as eleições municipais e rurais acontecerão, pela primeira vez, no mesmo dia em que se disputa a eleição presidencial.

Por um rápido período, pareceu que seria capaz de catalisar toda a oposição. Agora, os reformistas pregam o boicote, pregação que talvez se dissemine. Mas há um grande problema. Votar é obrigatório no Irã; se você não vota, suas chances de conseguir emprego no governo ou em organização semioficial ficam ameaçadas. Significa adeus a um precioso emprego fixo, com moradia grátis, nenhuma conta a pagar, salários decentes e benefícios.

Todos portam uma carteira de Identidade, com selos que comprovam o comparecimento às urnas, ano a ano. Muitos jovens urbanos letrados vão às urnas, mas votam em branco.

No Irã rural, as coisas são muito mais fáceis para o governo. Em dezembro de 2011, acabaram-se inúmeros subsídios para energia e bens domésticos. Para compensar o aumento da inflação, o governo começou a fazer pagamentos diretos a muitas famílias iranianas – assegurando o apoio dos eleitores em muitas províncias rurais.

Mir Hossein Mousavi
Para os ultraconservadores, nada é suficiente para impedir que se repitam os eventos de 2009, a onda verde, a vitória de Ahmadinejad sobre o reformista Mir Hossein Mousavi (que foi contestada), fúria nas ruas, demonstrações massivas, repressão violenta.

Mousavi, sua esposa (a artista Zahra Rahnavard), e o ex-presidente do Parlamento Mehdi Karroubi – todos figuras de destaque do Movimento Verde – estão em prisão domiciliar desde os grandes protestos de rua de fevereiro de 2011. A repressão não diminuiu – ao contrário (ver, por exemplo, matéria do Guardian).  E também respingou no campo de Ahmadinejad: até clérigos pró-Ahmadinejad foram perseguidos ou presos pelos serviços de segurança em algumas províncias, e cinco páginas de campanha pró Mashaie na Internet foram extintas.

Todas as redes virtuais privadas [orig. VPNs (virtual private networks)] foram fechadas, nos muitos cibercafés que há no Irã, e a velocidade da internet foi reduzida a passo de cágado.

Ainda que todo esse “aparelho de prevenção” funcione, e ainda que o Supremo Líder consiga eleger seu candidato (possívelmente, Qalibaf), a visão geral não é agradável.

O presidente pós-Ahmadinejad herdará uma paisagem política ultra fragmentada. Muita gente culpa a má administração do governo, tanto quanto as sanções internacionais, pelas imensas dificuldades do dia a dia. E a mesma hostilidade linha-duríssima contra os EUA, Israel e o eixo sunita. Uma espécie de desespero silencioso parece ser hoje meio de vida popular no Irã.


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