segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Venezuela, hoje: Os “Barrios” votam Chávez, pela democracia participativa


1/10/2012, The Real News Network (vídeo)
Transcrição traduzida pelo pessoal da Vila Vudu


LOCUTOR: Estamos em La Vega, um dos muitos barrios, periferias pobres de Caracas, localizadas em áreas precárias, de encosta de morros, na capital da Venezuela.

DAVID DOUGHERTY, CARACAS, VENEZUELA: Como em muitos enclaves urbanos na América Latina, barrios como La Vega surgiram de baixo para cima, construídos pelos próprios residentes, na ausência do Estado. Os moradores orgulham-se das comunidades que construíram, mas enfrentam problemas com a infraestrutura básica que podem tornar a vida difícil, às vezes, perigosa, para os moradores.

LOCUTOR: Áreas como esse setor de La Vega chamada Carretera Negra [Estrada Negra], são expostas a enchentes e deslizamentos na estação de chuvas mais fortes. Os moradores pedem, há décadas, a governos anteriores, que se construa aqui sistema adequado de drenagem para resolver o problema que, não raras vezes, ou inunda as casas ou as torna inacessíveis. Agora, os moradores já quase concluíram um sistema de drenagem, ao lado da estrada, um dos mais recentes exemplos de vários projetos propostos e executados por seu Conselho Comunal.

Os Conselhos Comunais são iniciativa do governo do presidente Hugo Chávez e brotaram pelo país, descritos como um novo modelo de democracia participativa. Incluem a formação de auto-organizações de vizinhos, moradores da própria comunidade, que propõem e votam projetos de desenvolvimento locais e políticas públicas, que eles mesmos executam, utilizando recursos distribuídos pelo Estado

Alexis Rojas é membro ativo do Conselho Comunal de Carretera Negra e ajudou a construir o novo sistema de drenagem de água.

ALEXIS ROJAS, membro do Conselho Comunal, La Veja: Aqui vimos como não só a região está mais bonita, mas, também, que já temos sistema de coleta da água da chuva, que acompanha o traçado da estrada na área de nosso Conselho Comunal. Melhoramos nossa qualidade de vida, a água já não se infiltra nos terrenos, o que reduz a possibilidade de deslizamentos. Hoje, com essa nova organização popular confiamos em nós mesmos, nos próprios cidadãos para tomar decisões em políticas públicas que afetam ou não, diretamente, nossa vida. Vemos aqui, atrás de mim, que os moradores da comunidade é que trabalham nas obras. Aqui praticamos essa forma de trabalho comunitário.

LOCUTOR: O estilo de liderança do presidente Hugo Chávez tem sido descrito pelos críticos como autoritário e paternalista, fazendo surgir dúvidas sobre quem realmente toma as decisões no modelo de Conselhos Comunais. Mas muitos participantes, como o organizador comunitário e residente desde sempre nessa área de La Veja, Freddy Mendoza, diz que os Conselhos Comunitários são modelo novo de desenvolvimento que está ajudando os venezuelanos mais pobres a tomar iniciativas de melhorias nas próprias comunidades, mediante processos de auto-organização e democracia participativa, revertendo afinal uma história de décadas de desinteresse e desleixo, de governos anteriores.

FREDDY MENDOZA, membro do Conselho Comunal, La Vega: Qualquer cidadão, de qualquer classe social pode formar um Conselho Comunal ou constituir um, uma nova Comuna. Todos têm o direito e o dever de participar. É o que estamos vendo, na Venezuela. Esse boom dos Conselhos Comunais nos barrios aconteceu porque nós, os mais pobres, antes, não podíamos participar de coisa alguma. Nos governos da 4ª República, choviam golpes sobre nós, de todas as direções. Para construir uma escada, era abaixo de violência, espancamentos, conseguir que construíssem uma estrada, abaixo de violência, espancamentos, nada mais difícil que conseguirmos um bom contrato de trabalho, sempre a Polícia, os cassetetes, os porretes e o gás lacrimogêneo. Hoje, temos instrumentos de organização, leis que nos capacitam e nos dão poder, a partir da [Constituição] Habilitante como as leis que criaram as Comunas e os Conselhos Comunais e outras, para resolver nossos problemas.

LOCUTOR: Outro exemplo de projeto de um Conselho Comunal, já executado e La Vega é o estabelecimento de um centro público de computadores e informação tecnológica, numa das salas da casa da família Mendoza, e que é parte do programa de “infocentros” do Estado, no qual as pessoas encontram acesso à Internet, assistem a aulas de computação e participam de oficinas, além de produzir documentários e noticiários gerados e editados na comunidade, com equipamento de edição eletrônica.
As mulheres são maioria nas assembleias dos Conselhos Comunais e maioria também nos postos eletivos dos Comitês: em torno de 60%.
Thais Rojas, de Carretera Negra, diz que os conselhos comunais estão capacitando as mulheres para que desempenhem novo papel, que antes não havia, nos processos públicos de construir decisões.

THAIS ROJAS, membro do Conselho Comunal, La Vega: Antes, só os homens tomavam decisões. Por que os homens e só eles? Por causa da mesma cultura machista que há no país, que ainda existe sequelas disso, e que dizia que só os homens são capazes de tomar decisões. As mulheres viram nos Conselhos Comunais, a oportunidade de mostrar tudo que sabem fazer e o muito que podem conseguir, porque afinal podem sair de casa, sair do papel de só cuidar de crianças, para se integrar no Conselho e poder lutar para resolver os problemas que atormentam toda a comunidade.

LOCUTOR: Os Conselhos Comunitários têm sido descritos como “motores” populares da Revolução Bolivariana e da Socialismo do Século 21 na Venezuela, mas também têm sido criticados. Alguns, como o sociólogo venezuelano Edgardo Lander, criticam a relação que se desenvolveu entre os conselhos comunais e o Estado, a qual, para ele, seria relação de clientelismo.

EDGARDO LANDER, sociólogo, Universidade Central da Venezuela: Estamos discutindo tensões e contradições. Acho que a tendência dominante é uma relação de clientelismo, na qual se impõe um determinado tipo de lógica uniforme sobre os setores populares, o que acaba por minar qualquer possibilidade de autonomia. Não estou dizendo que não haja luta por autonomia e por auto-organização. E que não exista, também, em parte, como consequência da política pública do governo Chávez, porque a política pública foi gestada, dirigida, e promoveu formas de organização, e as pessoas estão se apropriando dessas formas e fazendo coisas com elas. Não é, portanto, uma questão de com ou sem essas políticas, não há resposta única. O que estou dizendo é que há tensão, uma tensão forte, entre a busca de autonomia e a rendição ao clientelismo.

LOCUTOR: Morador de Carretera Negra e membro do Conselho Comunal, Freddy Mendoza diz que têm havido casos de corrupção em alguns Conselhos, e que compete ao próprios moradores e membros do Conselho da comunidade – não só ao Estado – resolver os conflitos e ir superando as contradições que surjam , ao mesmo tempo em que vão desenvolvendo seu novo modelo de democracia participativa.

FREDDY MENDOZA, membro do Conselho Comunal, La Vega: Há casos, de que tive notícias, em que conselhos comunais são controlados por uma ou duas pessoas. Nesse caso, o que há é representação, não participação. Há conselhos que recebem os recursos e simplesmente somem com o dinheiro e se apropriam dos recursos. Ou casos em que não construíram os projetos para os quais se destinavam os recursos. Mas tudo isso são dados culturais, éticos, morais, ainda ativos, que ainda se impõem na nossa consciência política, dos pobres. Tudo isso é parte da nossa luta política. O processo não termina no momento em que votamos em Chávez, não termina quando conseguimos resolver um problema no barrio. A discussão tem sempre de continuar, o processo de aprender e de reflexão, sobre o papel de cada um de nós nesse processo maior, que tem de desembocar numa revolução, estabelecendo um novo sistema de produção, organização e participação, que se chama democracia participativa. E assim por diante.

LOCUTOR: O candidato oposicionista à presidência, Henrique Capriles Radonski, declarou que os Conselhos Comunais tornaram-se organizações excessivamente politizadas. E propôs leis que visam à descentralização. Documento vazado mostra, supostamente, um esboço da política econômica de Capriles, caso seja eleito nas eleições do próximo dia 7 de outubro. É esboço de um plano para reduzir gradualmente a transferência de recursos do Estado hoje alocados para programas de desenvolvimento dos Conselhos Comunais.

DAVID DOUGHERTY, Caracas, Venezuela: Com as eleições já próximas, os esforços de campanha estão aquecidos nos Barrios como La Veja, fortaleza dos eleitores chavistas, onde os moradores prometeram defender o modelo de democracia participativa que, aos poucos, vai reformatando radicalmente as relações de poder para o desenvolvimento local, para os mais pobres, na Venezuela.

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