sexta-feira, 10 de agosto de 2012

A maior parte do “dinheiro de campanha” vai para a imprensa-empresa


7/8/2012, Michael Wolff, Commondreams
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

A realidade da arrecadação de fundos para campanhas eleitorais é que os “doadores” sempre recebem menos do que esperavam. A quem interessa, afinal, esse mar de dinheiro? A resposta é simples: às empresas de comunicações e à empresa-imprensa, com seus muitos tentáculos.

O que, afinal, esse mar de dinheiro – 2012 é a mais cara campanha eleitoral de todos os tempos – compra?

São 750 milhões de dólares para a presidência, números da campanha de Obama; Mitt Romney disse que sua campanha custará 800 milhões de dólares; e há mais algumas centenas de milhões, em dinheiro dos Super PAC. [1]

E o que obtêm as pessoas e empresas que apostam essa montanha de dinheiro em troca de influência política? Ou, pergunta mais direta: o que esse pessoal pensa? Por que ainda acreditam nessa “ferramenta”?

Pelo sim, pelo não, aqui vai o relatório de minhas doações de dinheiro para candidatos em eleições:

Tenho um amigo Democrata de fundo de investimentos em Massachusetts, que resolveu fazer carreira política. Já era umas 100 vezes mais rico que eu, mas, certo como o inverno, ele sempre aparecia pedindo mais dinheiro e mais dinheiro. (Eu ouvira dizer que o governador de Massachusetts põe qualquer um em Harvard. Então, pensava comigo, essa grana é pelas crianças.) Mas ele jamais venceu eleição alguma, mas infelizmente para mim, nunca desistiu de concorrer. E eu lá, assinando cheque depois de cheque, para que ele conseguisse disputar, perder e voltar, pedindo mais grana.

Também ajudei com cheques a campanha de Bill Clinton em 1992. Eu queria, então, uma coisa específica: ajuda para editar um livro que acabava de escrever. Acreditei num super arrecadador de dinheiro de campanha eleitoral (é profissão!), que disse que se eu ajudasse com a contribuição máxima, ele levaria o meu pedido de ajuda diretamente ao candidato – “não há erro”, disse ele. A última vez que o vi, ele metia o meu cheque, dobrado, na própria carteira.

Dia seguinte, o homem morreu tragicamente num acidente de avião. Mas não sem, antes, ter depositado o meu cheque. Assim sendo, fiquei sem a ajuda – mas, como milhares de outros, recebi meu convite unitário, pessoal e intransferível para a cerimônia de posse.

... a mídia-empresa vive de por fogo nos desentendimentos entre políticos e seus eleitores, ao mesmo tempo em que lucra diretamente com os incêndios que provoca.

Sheldon Adelson
Sheldon Adelson é um dos maiores doadores da atual campanha (segundo alguns suas doações já alcançam 100 milhões de dólares), primeiro para Newt Gingrich, agora para Romney, e acompanhou o candidato Republicano e sua entourage na visita que fizeram a Israel. Deve ser exatamente o que Adelson procura: algumas viagens divulgadas, ver o próprio nome nos jornais, um pouco de intervenção nas relações EUA-Israel, um pouco de orgulho baseado na fé. Sim, mas... Terá conseguido algum tipo de real influência no mundo político?

Não vejo como os dois teriam qualquer tipo de afinidade: o judeu pobre que faz fortuna no mundo dos cassinos e jogatina, e o mórmon de classe alta, para quem jogar e beber são tabu. Sejamos práticos: com tal investimento político, Adelson se torna, isso sim, uma pulga monstro na camisola do pessoal de Romney.

Esse pessoal consome tanto tempo arrecadando dinheiro quanto, depois, tentando passar a perna nos mesmos dos quais arrancaram dinheiro. Precisamente porque Adelson suporá que lhe devem muito, mais ele será rejeitado, ridicularizado, manobrado pela Casa Branca de Romney (se chegar a existir). Migalhas e desprezo: eis o que tocará a Adelson.

É possível que, naquela idade e com fortuna de 25 bilhões, ainda lhe interesse uma última subida ao palco público (todos os grandes doadores de campanha são homens idosos). Mas acho que isso também virará cinza: passadas as eleições, a imprensa apaga do mundo o nome dos doadores. (O que não significa que os doadores deixem de ser procurados para doar mais dinheiro.)

Os apoiadores da corretora Bain, de Romney, terão melhor senso de equilíbrio? Será que todos só põem dinheiro no cavalo Romney?

A estratégia de todos os caras de fundos privados que conheço – exceto os que, como aquele meu amigo e Mitt Romney, queiram virar políticos – é voar abaixo dos radares. Como agora aposta o presidente Obama, não há possibilidade de muita gente entender o negócio dos fundos privados – e menor ainda é a chance de aprovarem, caso venham a entender alguma coisa. Portanto, mesmo que Romney seja eleito, e os fundos privados consigam uma Casa Branca amigável, a única coisa que terão comprado com seus milhões de dólares investidos em campanhas eleitorais é um vastíssimo problema de desprestígio das respectivas marcas comerciais.

Para os doadores, mesmo assim, há o sentimento de que se engajam nas grandes disputas nacionais. Contribuir com uns poucos dólares, ou com uns poucos milhares de dólares – ou, se você tem bilhões, com a fatia equivalente em milhões de dólares – é uma espécie de interatividade. Você é parte do todo. Você significa. Você conseguiu. Você faz diferença.

É como postar um comentário na internet. Contudo... quantos comentaristas de internet dão a impressão de ser gente satisfeita, realizada, ativa? Não. Engajamentos desse tipo parecem ser, majoritariamente, atividade dos irados, furiosos, hostis, mal-humorados, azedos, biliosos. Meu palpite é que o que anima um comentarista de internet é muito semelhante ao que leva contribuidores de campanha a assinar cheques: contribuo porque estou furioso, ou doido.

Como se vê facilmente, as estratégias de campanha político-publicitária são orientadas pela premissa de que falar mal é emoção mais forte do que falar bem: convocar para destruir é mais eficaz do que convocar para construir.

A política é hoje a província dos infelizes, azedos e choramingas; talvez, porque, tendo pago, as pessoas sintam-se tungadas. (Ou, talvez, porque, tendo pago, as pessoas suponham que passariam a ter direito de se automanifestar, elas mesmas).

O visível desapontamento de muitos que apoiaram Obama em 2008 é, com certeza, amplificado pelo fato de que, naquela espantosa avançada de pequenas contribuições, tantos tenham percebido que estavam sendo obrigados a pagar pelo privilégio de serem “representados”.

Mas alguém tem o direito a extrair algum proveito dessa eleição de 2 bilhões de dólares, além do eleito.

Esse é o ponto no qual, parece, todas as análises dos financiamentos de campanha eleitoral perdem gravemente o rumo: quando apontam, como objetivo oculto dos 2 bilhões, a mera compra de influência escusa e indireta. Melhor fariam todos se observassem mais direta e exatamente quem embolsa a grana e, portanto, quem tem interesse em promover o jogo e mantê-lo exatamente como é.

Em primeiro lugar nessa lista, aparece a mídia-empresa. A política eleitoral presidencial é, hoje, a diferença entre o lucro e o prejuízo para muitas redes de televisão nos estados “oscilantes” (e em todos eles há sempre uma ou duas grandes empresas de televisão e comunicações que reinam, dominantes).

Se se presta atenção a quem tem o maior interesse financeiro em manter as divisões partidárias e a hostilidade entre elas, na política contemporânea, só se vê, com destaque, um agente: o negócio da imprensa-empresa, as gigantes da comunicação. É conflito estranhíssimo: a mídia-empresa vive de por fogo nos desentendimentos entre políticos e seus eleitores, ao mesmo tempo em que lucra diretamente dos incêndios que provoca.

Em segundo lugar, aparecem as agências de publicidade, que compram espaço na mídia. Plantados entre o doador de campanha e o destinatário do dinheiro, está o pessoal que, de fato, gasta a dinheirama arrecada. Em muitos casos, recebem uma fatia do dinheiro: uma percentagem da venda de anúncios (em geral entre 8% e 15%), vai diretamente para eles. É o negócio dos intermediários e operadores políticos: consultores contratados em todas as campanhas (em todos os níveis e planos em que haja eleições) e, atualmente, nos EUA, também os Super Pacs que, todos, se converteram em grandes compradores de tempo na grande mídia-empresa em todo o país. (O que é o mesmo que dizer que os Super Pacs são hoje negócio altamente lucrativo.)

Karl Rove
Karl Rove não assessora o American Crossroads Super PAC, de graça.

Na essência, esse pessoal que define os termos da disputa – quanto mais dinheiro gasto, mais acirrada a disputa – que determina o tom da campanha, que define o custo das campanhas e que administra o caixa da campanha, é quem mais ganha, diretamente, do dinheiro arrecadado e gasto.

Todos os demais envolvidos ganham sempre muito menos do que esperavam.



Nota dos tradutores
[1] O Super PAC é a mais nova besta que emergiu de unirem-se duas regras criadas pela Suprema Corte, uma delas de 2010. Oficialmente chamado “comitê independente para administrar gastos de campanhas eleitorais”, o Super PAC logo se converteu em meio pelo qual grupos de influência passaram a operar diretamente nas eleições. O Super PAC é muito semelhante aos tradicionais PACs (Political Action Committee/Comitê de Ação Política), mas livre de muitas das limitações que pesavam sobre os PACs. Por exemplo, um Super PAC pode arrecadar e gastar quantias ilimitadas de dinheiro com o exclusivo propósito de apoiar ou fazer oposição a candidatos ou a políticos eleitos. Um Super PAC pode viver exclusivamente para atacar um ou mais candidatos. O único impedimento é que não pode haver ligação de coordenação direta entre um Super PAC e algum candidato ou partido.

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