sexta-feira, 18 de maio de 2012

Laerte Braga: “O assassinato de Dona Cremilda”


Laerte Braga

Laerte Braga

Há anos passados, a propósito de uma dessas obras monumentais que governos costumam fazer e que não têm sentido ou se têm, é porque se ajustam à perversidade do capitalismo, o jornalista Millôr Fernandes, diante da perspectiva de desapropriação de casas de famílias que moravam no local há mais de meio século, escreveu o seguinte em protesto contra o fato – “nenhum carro vale uma vida humana”.

Cremilda Fernandes, 72 anos, professora no Espírito Santo, morreu na quinta-feira ao término de uma manifestação contra toda a sorte de trapaças de governantes. Era, como muitos brasileiros, a imensa maioria, uma das vítimas da insensibilidade de monstros que governam na nossa democracia. Um infarto fulminante. Momentos antes de sua morte havia dito a vários dos presentes à manifestação que queria participar do ato, panfletar e ouvira do motorista de táxi que a levara até o local que, finalmente, ele havia entendido que o ex-governador Paulo Hartung é apenas um chefe de quadrilha de assaltantes de cofres públicos.

Dona Cremilda, de calça comprida branca, panfletando momentos antes de seu assassinato

Não difere de Sérgio Cabral, de Antônio Anastásia, de Beto Richa, de Raimundo Colombo, de Geraldo Alckmin, Marconi Perillo e tantos outros.

O ser humano é um número, um objeto na roda cruel do capitalismo e aos olhos de figuras como Demóstenes Torres, ou as bancadas do PT e do PMDB, que ao lado do PSDB, PPS e outros iguais, pretendem transformar a CPMI do Cachoeira em farsa, em jogo político e espetáculo de mídia, enquanto entregam alguns anéis e salvam os dedos.

O clube de amigos e inimigos cordiais que opera o Estado em suas três dimensões.

Cremilda Fernandes aos 72 anos estava buscando, indignada e corajosa, os seus direitos. Receber um precatório que lhe era devido e a professores no Espírito Santo. Paulo Hartung, que continua governando o estado como uma espécie de fantasma sobre a pasmaceira do governador nominal Renato Casagrande, sumiu com os precatórios numa grossa fraude que os indícios apontam envolver a REDE GAZETA, afiliada da REDE GLOBO naquele estado.

Precatórios existem em todos os estados e não são pagos a despeito de ações judiciais com trânsito em julgado, enquanto atitudes não são tomadas e atitudes nunca são tomadas.

Bandidos ficam impunes com a cumplicidade de um JUDICIÁRIO corrupto e/ou leniente.

Professores são sempre o bode expiatório de governos insensíveis e governantes sem qualquer respeito pelo ser humano, como pela classe trabalhadora no seu todo.

Anos depois é que vão para a cadeia (mas não por muito tempo) dois dos principais executores do massacre de trabalhadores sem terra em Eldorado do Carajás.

Governantes são construídos a partir de interesses das elites, da classe dominante, num espetáculo gerado por especialistas e pela mídia de mercado, na crença que eleições de tempos em tempos significam democracia.

Governos atuam sem a menor participação popular no processo de decisões e bancadas em câmaras municipais, assembléias legislativas, Câmara Federal e Senado se constituem em representantes de “ruralistas” igual a latifundiário/trabalho escravo, evangélicos sustentados na fé cega de inocentes ludibriados e espertalhões associados a bancos e grandes empresas. O que sobra de compromisso popular é mínimo diante do estrago que essa gente causa.

E quase sempre, no âmbito do clube de amigos e inimigos cordiais, mesmo que fora, são como sino de madeira, não ecoam, pois a mídia é podre como se vê agora no caso da CPMI da VEJA e no esforço titânico das outras quadrilhas de mídia em defender a quadrilha Civita.

A professora Cremilda Fernandes, pouco antes de morrer, havia declarado que “espero há anos por manifestações assim”.

Não existe saída fora da luta popular e da ampla participação popular no processo de decisões.

Isso implica em organização, em formação, em conscientização e em ir às ruas buscar direitos, pois de outra forma os gangsters que operam o poder continuarão a gerar cachoeiras que se manterão impunes, lépidos e fagueiros, enquanto se joga o jogo da mentira combinada e contratada nas falsas comissões de investigações.

Um país com Roberto (Gaveta) Gurgel como Procurador Geral da República e Gilmar (Dantas) Mendes no Supremo Tribunal Federal não pode esperar seriedade ou avanços democráticos. No máximo novos escaninhos para esconder os mal feitos ou tapetes para varrê-los para baixo e fazer parecer que a sala está limpa.

“Informado” pela imprensa-de-mercado-de-repeticão (Grupo GAFE, Globo, Abril, Folha, Estadão), as mídias regionais como RBS, ou estaduais como Estado de Minas (MG), Rede GAZETA (ES), etc., um povo não pode adquirir consciência da realidade e se permite massacrar pelos que, de fato, governam – banqueiros, latifundiários e o capital internacional.

Umas forças armadas (assim mesmo em minúsculas) que reage à verdade não pode pretender o respeito. Tentar esconder o caráter e a natureza do golpe militar de 1964, seus requintes de barbárie, é ocultar a História.


Não cumprir o tal preceito que todo cidadão é igual perante a lei, ou transformá-lo em ficção jurídica/constitucional, negar direitos básicos, tem sido uma constante de governos. Avanços paliativos não levam às mudanças estruturais que o Brasil necessita e pouco a pouco vamos nos transformando num entreposto do capital internacional, vamos virando parte do plano GRANDE COLÔMBIA, concebido pelos senhores do mundo, EUA e Israel.

A morte da professora Cremilda Fernandes tem essa dimensão; causa esse impacto vivo na lição de luta que deixa. Uma brasileira do Espírito Santo, 72 anos, indo às ruas por direitos que a tal lei lhe assegura, mas um tal Paulo Hartung, chefe de quadrilha de assaltantes de cofres públicos e um governador que se “abanana”, Renato Casagrande, lhes negam na presunção de que isso é democracia e a ordem constitucional impõe esse tipo de procedimento.

São só monstros gerados pelo capitalismo. Como os monstros que permeiam Minas, o Rio de Janeiro, a Bahia, Brasília, São Paulo, etc., etc.. Ou que constroem Belo Monte em regime de escravidão imposto aos trabalhadores e a “lei” imposta pela violência policial.

Para esse tipo de gente um carro vale mais que uma vida humana. Nessa direção breve as igrejas dos automóveis divinos como símbolos da existência e o povo à margem do processo político e das decisões que lhe dizem respeito.

A professora Cremilda é, ela sim, um símbolo, como todos os trabalhadores, que indignar-se é ir à luta e a luta é nas ruas, é o caminho. Fora dos clubes fechados dos amigos e inimigos cordiais que dominam o Estado-instituição.

Ou das tais “normas de conduta” do governador cachoeira Sérgio Cabral, sinônimo de Anastásia, Alckmin, Richa e toda a corja.

É necessário entender também que a corrupção é inerente, parte inseparável do capitalismo, aqui ou em qualquer lugar do mundo.

Jogar por terra o atual modelo político e econômico, esse é o sentido da luta popular.

Enviado por Sílvio de Barros Pinheiro e Nanda Tardin
Manchete do artigo alterada e ilustrações por redecastorphoto
Foto enviada por Nanda: copyleft Joelma
Título original do artigo: Nenhum carro vale uma vida humana

2 comentários:

  1. (comentário de Rafael Patto via Facebook, postado por Castor)

     Rafael Patto
    ‎Castor, agradeço sua gentileza em compartilhar esse link no meu mural. Li com a atenção e a consideração que o oferecimento de um amigo merece. Lamento muito pela morte da D. Cremilda. Acho que fatalidades como essa justificam sim a indign...ação daqueles que se dedicam a essa batalha diária que é o empenho em somar esforços para a construção de um país mais justo, fraterno e solidário, e uma sociedade mais humana. Concordo com as críticas que são feitas à "imprensa-de-mercado-de-repeticão", que desinforma o público e protege os bandidos infiltrados nas estruturas do poder, bem como compreendo os ataques que o autor dirige às autoridades públicas, entre as quais representantes políticos eleitos pelo povo, que representam um verdadeiro ultraje à democracia brasileira, como é o caso dos muito bem lembrados Gilmar Mendes e Roberto Gurgel. Em todo caso, me reservarei o direito de discordarr veementemente de um trecho capital deste artigo que vc me sugeriu e que é determinante para que eu não o replique. Refiro-me ao trecho em que o autor embola o meio-de-campo colocando a bancada do PT no mesmo balaio em que estão as bancadas do DEM, do PSDB e do PPS. Não posso compactuar com essa visão porque ela reproduz exatamente a leitura enviesada que essa mesma mídia corrupta que é tão corretamente criticada no texto quer oferecer ao público. É muito precipitado já apresentar conclusões acerca dos rumos que a CPMI do Cachoeira irá tomar. Afirmar, desde já, que ela será transforma em "farsa", "jogo político" ou "espetáculo para a mídia" como fez o autor é colaborar com o discurso que a própria imprensa quer disseminar, e é, em última análise, fazer o jogo da oposição, que tá doidinha pra melar todas essas investigações. Talvez essa leitura exacerbadamente negativista do autor se deva a alguma afetação dos sentidos provocada pela morte da professora capixaba, o que é até compreensível. Mas o que não podemos nos permitir é embarcar nessa onda do "tudo tá perdido", "ninguém presta", "todo partido é igual". A CPMI prosseguirá sim, confiemos.

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    1. Concordo inteiramente com a argumentação do Rafael. Creio mesmo que seria importante o Laerte contrapor a ideia negativista do artigo com uma visão mais realista quanto a ação política.

      Não se pode pretender consciência participativa de um povo desinformado, despolitizado e, consequentemente, desorganizado socialmente.

      O Laerte infelizmente não percebeu que os embriões de organização social (sindicatos e movimentos sociais p. ex.) ainda são incipientes e com ação política limitada; mesmo porque essas organizações são tenaz e violentamente combatidas pela imprensa-de-mercado e pela classe dominante.

      Creio que a luta séria passa pelo combate à imprensa-de-mercado e contra a jagunçada MILICANALHA que, infelizmente, ainda tem voz em nosso país.

      A CPMI Veja/Cachoeira é apenas mais uma das muitas arenas onde travaremos combate. É claro que a mídia vai querer transformar a CPMI num mero "espetáculo". Cabe a nós da blogosfera toparmos a batalha tal como vimos fazendo, mas sem o pessimismo carrancudo e choroso do artigo.

      Não devemos e não podemos nos deixar pautar pela mídia comercial. Temos e já estamos aprendendo a construir pauta própria de combate às mentiras, tergiversações e manipulações da imprensa. É só... Por enquanto.

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