quarta-feira, 4 de abril de 2012

QUESTÃO DE NOME


Laerte Braga

Imagine que por esse Brasil continental num arroubo de “patriotismo”, naquele negócio de “ame-o ou deixe-o”, um pai vestido de verde e amarelo tenha ido ao cartório registrar o nome do filho e o nome dado ao funcionário era exatamente o de Emílio Garrastazu Medice, o carniceiro de plantão à época. E que tenha ficado assim Emílio Garrastazu Medice da Silva.

Jorge Rafael Videla foi um dos mais cruéis ditadores da safra latino americana de tiranos nas décadas de 60 e 70. Um funcionário público de 34 anos de idade conseguiu na justiça argentina mudar o seu nome de batismo. Jorge Rafael Videla. Segundo disse ao juiz o pai havia feito uma aposta com um irmão. O primeiro a ser pai de um filho homem daria o nome do presidente.

O funcionário alegou que perdeu empregos, era alvo de críticas, chacotas, enfim, que o nome Jorge Rafael Videla só lhe trazia problemas. O ex-ditador cumpre pena de prisão perpétua. Foi autorizado a mudar o nome. Agora é Jorge Videla Shiel. O sobrenome é o da mãe.

No Brasil há uma lei que proíbe nomes considerados aberrações. Garrastazu Medice seria sim uma aberração.

No auge da carreira do apresentador de tevê Flávio Cavalcanti – de extrema direita e com papel importante no golpe de 1964 – um pai num estado do Nordeste tentou colocar o nome de Flávio Cavalcanti Rei da Televisão Brasileira em seu filho. Não conseguiu.

Esses nomes bizarros são acrescidos de contradições. Em Minas houve ou há, não se tem notícia dele mais, um Lenine Hitler. 

Bem mais sincero e autêntico foi Mané Garrincha que quando um pai lhe disse, ao final do treino no Botafogo, que seu filho iria chamar Garrincha, disse na bucha – “deixa de ser bobo, bota João que é melhor”.

Sincero e autêntico porque Garrastazu Medice teria enviado um telegrama ao pai do hipotético Emílio Garrastazu Medice da Silva, até tirado foto com o bebê, como fez Flávio Cavalcanti. Foi além do telegrama. Passou quinze minutos de um dos seus programas falando sobre o fato e declinando “modestamente” da homenagem.

Em tempos passados quanto mais nomes fossem dados ao bebê mais forte ele seria. Era costume na nobreza. Dom Pedro II tinha quinze ou dezesseis nomes.

A quantidade de Luís Carlos existente no Brasil resulta do extraordinário prestígio popular do líder comunista Luís Carlos Prestes. Mas nenhum Luís Carlos Prestes do Partido Comunista Brasileiro da Silva. Luís Carlos bastava.

Quando o presidente Eurico Gaspar Dutra cassou o registro do PCB alegando tratar-se de organização estrangeira, um dos temores da direita no Brasil era que Prestes, então senador eleito pelo PCB no Rio de Janeiro, a capital do País, viesse a disputar a presidência e vencesse.

Eu não posso adivinhar o motivo que levou a mãe ou o pai do governador de Minas, Antônio Anastásia a buscar esse nome. Em voga à época o nome da princesa Anastácia, suposta sobrevivente da família real russa após a revolução de 1917.

Mas posso imaginar que o colírio Moura Brasil aliviou problemas oftalmológicos de Colírio Moura Brasil de Sousa.

Getúlio Vargas foi outro que deixou uma “prole” imensa. Juscelino nem tanto e Jânio nem deu tempo, renunciou com sete meses de governo.

Pelé andou em voga durante um bom tempo, mas com seu nome de batismo, Edson.

É fácil entender porque tanto José e tanta Maria. O curioso aí é que José é, quase sempre, só José e Maria é das Graças, de Fátima, das Dores, Maria José, da Piedade e vai por aí afora.

Um senhor de escravos, barão dos velhos tempos, para que não houvesse erros quanto ao tratamento a ser dispensado à sua filha chamou-a de Senhorinha Barão não sei das quantas. Lá pelo fim, depois do sexto ou sétimo qualificativo, vinha o nome Maria da Glória.

O trem é complicado e nem Freud se aventurou por esse terreno.

Mas convenhamos, Jorge Rafael Videla é dose para leão, como dose para leão seria – quem sabe não existe? – Emílio Garrastazu Medice da Silva. No caso do brasileiro o problema seria o desconhecimento da imensa maioria das pessoas. No máximo uma pergunta sobre o esquisito Garrastazu. Nome de carrasco francês.

Qual era o nome do cara que baixou a lâmina da guilhotina cortando o pescoço de Maria Antonieta? Garrastazu?

O daqui tinha métodos diferentes. Pau de arara, choques elétricos, estupros, porradas pura e simplesmente e um monte de garrastazuzinhos incrustrados em DOI/CODI tudo em nome da “democracia”.

Não tem uma semana essa turma andou pulando de pára-quedas numa praia do Rio de Janeiro, saudando o golpe de 1964 no Clube Militar e inflando o peito em patriotismo acendrado todos vestidos com a saia modelo Geisel da anistia ampla, geral e irrestrita.

Já o Videla original está na cadeia e lá vai ficar o resto da vida. É lugar de tiranos, de torturadores.

Nos velhos carnavais havia uma dessas marchinhas que hoje não se encontra mais, dizendo que em Cuba quem anda na contramão vai para o paredón e aqui, acaba na televisão.

Ou colunista da FOLHA DE SÃO PAULO.

Já pensou um pai patriota batizando o filho de Brilhante Ulstra Patriota do Brasil Pereira da Silva?

Ia haver uma revolução só de Pereiras da Silva indignados.   

Enviado por Sílvio de Barros Pinheiro

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