segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Como? Empobrecer primeiro?


Não é a primeira vez e certamente não será a última que ouvimos dos nossos digníssimos governantes declarações infelizes.

Desta feita, porém, a declaração em causa revela uma manifesta falta de sensibilidade para com os problemas sociais do país.

Supostamente a Questão Social deveria ser a causa maior de qualquer governo digno desse nome. Mas não é. Recentemente o 1º. Ministro Passos Coelho, perfeitamente alinhado com os Agiotas Internacionais representados pela Troika, brindou-nos com a supimpa declaração de que:

“Temos que empobrecer para sairmos desta situação”.

Assim mesmo. Sem pestanejar…

A História diz-nos que nenhum país cresce, empobrecendo a Força de Trabalho. Pelo contrário. Sempre que o Trabalho é devidamente compensado, a riqueza cresce e gera Desenvolvimento. O melhor exemplo do que afirmamos, é o caso da Alemanha durante o Ministério do Chanceler Otto von Bismarck, que inaugurou o Estado-providência, como forma de estimular a Economia.

Os trabalhadores alemães, como agentes produtivos, passaram a ter direitos sociais e protecção social. Além da Previdência Social, estabeleceu também programas de crédito barato à iniciativa privada para a produção de bens do consumo corrente. As infra-estruturas, as matérias-primas e a moeda estavam a cargo exclusivo do Estado.

Foi graças a esta política de intervenção estatal na Economia que a Alemanha se tornou uma potência Económica no final do Século XIX. Curioso assinalar que aquele político, considerado o Napoleão Germânico, nem sequer era marxista. Pelo contrário, foi um conservador e monárquico. Não foi, portanto, com Investimento Directo Estrangeiro e Financiamento externo, cujos operadores querem sempre, obviamente, trocar um chouriço por um porco… nem com um Estado ausente da Economia e omisso na Questão Social, como agora se defende, que a Alemanha alcançou naquela época o patamar do Desenvolvimento. A História do seu actual desenvolvimento porém, já não se conta da mesma maneira… embora as suas raízes remontem àquele século.

Os países na esfera de influência da Alemanha, como os Escandinavos, seguiram o mesmo modelo Económico. Daí que não nos admiremos de ver hoje o superior nível de vida de tais países, cujos altos Índices Humanos são os mais elevados da Europa e do Mundo, acima dos 0,950 (o máximo é 1, que ninguém até agora alcançou). E são-no, porque dedicam às despesas sociais, um valor superior a 30% do PIB, sendo a Suécia campeã, com 38,2 %.

Os USA, por exemplo, ficam-se pelos irrisórios 19,4%, embora seja ainda detentor da maior Economia Mundial, e Portugal, antes da austeridade forçada, pelos 25,5%. Significativo, o leitor não acha?

A propósito de um chouriço por um porco… o Ministro da Economia faz-nos pobres, mas de outra maneira…

No início deste mês anunciou triunfalmente um contrato de concessão com a Colt Resources para extracção de ouro numa mina no Alentejo. Questionado sobre as vantagens para a Economia Nacional, depois de falar com algum entusiasmo dos postos de trabalho que irão ser criados, informou que o país terá um retorno de 4%, acrescentando que tal valor está alinhado com o praticado no mercado, sempre este… agora na moda.

Parece até desculpa de quem é apanhado com as calças na mão…

Ora a questão que se levanta é: porque não os 100%? Porque só 4% de royalties e não mais?

Podemos até compreender que o Estado não tenha neste momento capacidade de investimento para meter ombros ao empreendimento. Mas bolas, parece-nos que estamos a entregar o ouro ao bandido…

Acerca desta questão, todavia, que consideramos de grande interesse para a nossa Economia, não vimos até ao momento ninguém levantar a voz, nem levantar, nem baixar… Porque será?

A pobreza de uma Nação não se faz apenas rebaixando o valor do Trabalho… Mais, não queremos ser impertinentes, mas perguntamos: será apenas uma coincidência a Colt Resouces ser uma multinacional canadiana do ramo e o nosso simpático Ministro ter sido até há pouco professor de Economia na Simon Frazer University, no Quebeque, Canadá? Deixamos a pergunta aos investigadores da “Teoria da Conspiração”…

Em recente conferência de imprensa, a Troika declarou que “…os salários do sector privado deverão seguir o exemplo do sector público…”. Ora, se o corte dos salários na função pública já é uma violência social, imoral até, porque tira o pão da boca a muita gente, como não o será no sector privado, mais numeroso e onde se praticam salários de miséria em muitos sectores? Além do mais, tal medida, a ser implementada, irá afundar ainda mais a curva do Crescimento Económico, que se prevê negativo em 3,5%, e logo o Défice Orçamental irá subir, mesmo que as despesas sociais não aumentem em extensão.

A coisa é tão escabrosa que até levanta vozes discordantes, de figuras insuspeitas, como Belmiro de Azevedo, grande empresário do sector do comércio de bens alimentares, para quem a austeridade e a falta de uma estratégia de crescimento da Economia não pode conduzir-nos ao “nascimento de um exército de excluídos e à miséria absoluta”.

Para se perceber que não são os salários e a produtividade dos trabalhadores portugueses que condicionam a falta de competitividade da nossa Economia, basta consultar os dados do EUROSTAT para este ano.

Este organismo de estatística da Comissão Europeia informa que o custo médio de hora de trabalho em Portugal é de 12,22 €. Na Zona Euro, esse valor é de 26,22€, ou seja, mais de 114%! Em termos de horas de trabalho por ano, os trabalhadores portugueses também estão em desvantagem, 1737 horas anuais contra 1668 horas do conjunto dos países da Zona Euro, para o sector industrial. São, portanto, menos 4%, ou seja, os trabalhadores industriais da Zona Euro trabalham menos que os portugueses e ganham mais do dobro.

A propaganda da Elite Dirigente, todavia, com muitos parvos à mistura, consegue convencer o Zé Ninguém de que é um mau trabalhador e que é o grande culpado da Crise da Dívida e do Euro.

Por outro lado, se considerarmos os salários médios anuais, Portugal fica em último lugar, sendo que a Dinamarca é o 1º deste ranking, onde o valor médio salarial anual é 2,9 vezes o valor do salário médio de um trabalhador português.

A produtividade contudo, do trabalhador dinamarquês, é pouco mais que 1,57 vezes a do trabalhador português. Significa que um trabalhador em Portugal, com a mesma produtividade daquele, recebe pelo seu trabalho menos 87% de salário médio anual!

Há, pois, uma substancial diferença entre trabalhar no “Reino da Dinamarca” e trabalhar na “República Portuguesa”.

Então das duas, uma: ou o trabalhador dinamarquês é um grande preguiçoso, por que os bens que produz são mais caros 87%, ou o empresário português é ganancioso… pois paga menos 87% do que devia pagar aos seus trabalhadores, considerando a mesma produtividade que se verifica no mundo laboral da Dinamarca.

Estamos em crer que é esta última, a ganância, a razão de tão grande disparidade. Independentemente da carga fiscal e social sobre o Capital, de que os empresários portugueses se queixam muito, serão as margens de lucro, que só os deuses conhecem… substancialmente mais altas aqui do que na Dinamarca, que retiram competitividade às nossas exportações.

Por estes números, não se compreende pois a insistência em rebaixar a remuneração do Trabalho, a menos que se pretenda transformar Portugal na China da Europa…

Esta mentalidade, infelizmente, está muito presente na nossa Sociedade há séculos.

Ainda esta semana, depois de referirmos as vantagens comparadas entre o mundo laboral português e o resto da (des)União Europeia, um dos nossos interlocutores, que tem uma mercearia de bairro, das que ainda, felizmente, existem, atalhou logo, sentenciando com o dedo em riste, que o empregado nacional quer é ganhar muito e trabalhar pouco, ao que nós, perfeitamente irritados, pois o homem não entendeu patavina do que acabáramos de esclarecer, reagimos: “Pois é, meu caro. Está-se a ver que o senhor é daqueles que ainda vive no tempo da escravatura… Bom mesmo, é trabalhar de graça, não é?”

Claro que existem bons e maus trabalhadores, como também existem bons e maus patrões. A generalização, infelizmente um mau hábito muito praticado entre nós, ao violar princípios de racionalidade e inteligência, impede a Concertação Social e o Consenso Político, tão necessários à superação da Crise.

Ponta Delgada, 20 de Novembro de 2011 

Escrito e enviado por Artur Rosa Teixeira, correspondente da redecastorphoto em Portugal, Ultramar e arrabaldes.

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