sexta-feira, 25 de novembro de 2011

BRICS bloqueiam os EUA no Oriente Médio [1]


25/11/2011, *MK Bhadrakumar, Indian Punchline (excerto)
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

A reunião dos vice-ministros de Relações Exteriores dos países BRICS em Moscou, ontem, sobre a situação no Oriente Médio e Norte da África é evento de grande importância, como se vê pelo Comunicado Conjunto. Os principais elementos do Comunicado são:

a) Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (BRICS) assumiram posição comum sobre o que hoje se conhece como “Primavera Árabe”. Identificaram-se os princípios básicos dessa posição: o foco deve ser diálogo nacional pacífico; nada justifica qualquer tipo de intervenção estrangeira; o papel central nas decisões compete ao Conselho de Segurança da ONU.

b) Os BRICS adotaram posição comum sobre a Síria. A frase chave do Comunicado é “Fica excluída qualquer tipo de interferência externa nos assuntos da Síria, que não esteja conforme o que determina a Carta das Nações Unidas.”

c) Os BRICS exigiram “revisão completa” para avaliar a adequação [orig. appropriateness] da intervenção da OTAN na Líbia; e sugeriram que se crie missão especial da ONU em Trípoli para conduzir o processo de transição em curso; dessa comissão deve participar, especificadamente, a União Africana. 

d) Os BRICS rejeitaram a ameaça de força contra o Irã e exigiram negociações e diálogo continuados. Muito importante, os BRICS criticaram as ações de EUA e União Europeia de impor novas sanções ao Irã, chamando-as de medidas “contraproducentes” que só “exacerbarão” a situação. 

e) Os BRICS saudaram a iniciativa do Conselho de Cooperação do Golfo, que encontrou saída negociada para o Iêmen, como exemplo a ser seguido. 

É momento sumamente importante para os BRICS – e também para a diplomacia russa. Cresceu consideravelmente a credibilidade dos BRICS como voz influente no sistema internacional. Espera-se que, a partir da posição comum agora construída sobre as questões do Oriente Médio, os BRICS passem a construir posições comuns também em outras questões regionais e internacionais. 

Parece evidente que a Rússia tomou a iniciativa para o encontro da 5ª-feira e o Comunicado Conjunto mais ou menos adota a posição que a Rússia já declarou sobre a Primavera Árabe. É vitória da diplomacia Rússia, que ganha diplomaticamente, ter obtido o endosso dos países BRICS também no que diz respeito às graves preocupações russas quanto à situação síria, ante ao risco, cada dia maior, de o Irã sofrer ataque de intervenção ocidental semelhante ao que ao que a Líbia sofreu.

Recentemente, Sergey Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia, manifestou vigorosamente as crescentes preocupações russas. Moscou mostrou-se frustrada com o ocidente e a Turquia, que têm interferido claramente no caso sírio, não só contrabandeando armas para o país e incitando confrontos que, cada vez mais, empurram o país para uma guerra civil, mas, também, sabotando ativamente todas as tentativas para iniciar um diálogo nacional entre o regime sírio e a oposição. 

A posição dos BRICS também será bem recebida em Damasco e em Teerã. Mas, ao contrário, implica dificuldades para os EUA e seus aliados, que investem muito em fazer crescer a tensão contra a Síria e o Irã. A Índia ter participado da reunião em Moscou, e ter assinado o Comunicado conjunto também é notícia particularmente importante. Washington registrará. A Rússia, na prática, conseguiu que os BRICS assinassem clara censura às políticas intervencionistas dos EUA no Oriente Médio[2].
Muito claramente, não há caminho aberto, agora, para que os EUA consigam arrancar autorização do Conselho de Segurança da ONU para qualquer tipo de intervenção na Síria. A Turquia, em relação à Síria, pode ter dado passo maior que as pernas. E Israel também recebeu uma reprimenda. 

A formulação que se lê no Comunicado conjunto dos BRICS – “segurança igualitária e confiável” para os países do Golfo Persa, a partir de um “sistema de relações” – pode ser vista, sim, como repúdio ao advento da OTAN como provedor de segurança para a região. O Comunicado Conjunto dos países BRICS pode ser lido em inglês (hoje, ainda em inglês. Aliás... por que em inglês?! Já deveria, evidentemente, lá estar, é claro, em português [NTs]).




Notas dos tradutores
[1] Sobre o mesmo assunto, interessante ver, para comparar, o que diz a BBC Brasil em 24/11/2011, Brasília (Diplomacia dos BRICS lança comunicado conjunto sobre a Primavera Árabe). Fica-se sem saber se o jornalista e o jornalismo e o jornal são mesmo insanavelmente incompetentes para o trabalho que deveriam saber fazer, mas não sabem, ou se há, mesmo, claro e ativo ânimo de desinformar.

*MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

Um comentário:

  1. (comentário enviado por e-mail e postado por Castor)

    Mesmo levando em consideração que a primavera árabe poderia ter sido um processo desestabilizador totalmente artificial conduzido pelos sistemas de “inteligência” dos Estados Unidos, de alguns países europeus e de Israel ou até mesmo de mercenários nativos e estrangeiros infiltrados em países árabes/alvo ou vítimas – pode-se também inferir a conclusão que as massas populares (milhões de indivíduos em movimento, irados e protestando contra situações específicas em seus países) podem extrapolar a encomenda realizada, radicalizar processos e com isso desestabilizar simultaneamente o "establishment" do pais/alvo e também dos países seus mentores estrangeiros.

    E se isso acontecer poderemos constatar que o feitiço pode virar contra o feiticeiro e frustrar a encomenda inicial. Tal situação pode ser comprovada pelas posições que estão assumindo Rússia/China inicialmente de perplexidade, depois de advertência ao nível diplomático dirigida aos países desestabilizadores e agora abertamente militarista (enviando militares armados à zona do conflito) ou mesmo municiando o país alvo/vitima com equipamentos militares sofisticados de defesa (tipo mísseis terra/ar e outros).

    E no artigo acima temos uma clara advertência do grupo BRICS – que podem paralisar ao nível diplomático a potencial encomenda maquiavélica de desestabilizar artificialmente países e regiões.

    Jacob David Blinder
    PS: Em se brincando com o povo pode-se saber onde está o começo da brincadeira – mas ninguém pode saber como ela termina.....

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