quarta-feira, 13 de julho de 2011

EUA criam desculpas e atrasam a recuperação econômica

Paul Krugman 12/07/2011 - 01h27


Se o estímulo econômico parece ter fracassado nos EUA, isso ocorreu porque nunca se tentou de fato implementá-lo

Quem ficou chocado com o relatório sobre o nível de emprego nos Estados Unidos, divulgado na última sexta-feira, e quem acreditava que nós estávamos indo bem e ficou desanimado com as más notícias, não estava prestando atenção no que está acontecendo. O fato é que a economia dos Estados Unidos está presa em um buraco há um ano e meio.

Mas uma passividade destrutiva tomou conta do nosso discurso. Quem ligar a televisão verá imediatamente algum especialista que gosta de se iludir declarando que não se pode fazer muita coisa em relação aos problemas de curto prazo enfrentados pela economia (um lembrete: esse “curto prazo” já está no seu quarto ano), e que nós deveríamos nos concentrar no longo prazo.

Mas esta é exatamente a opinião errada. A verdade é que a criação de empregos em uma economia deprimida é algo que o governo poderia e deveria estar fazendo. Sim, há enormes obstáculos políticos para que sejam implementadas ações – especialmente o fato de a Câmara dos Deputados estar controlada por um partido que se beneficia da debilidade da economia. Mas impasse político é algo que não deveria se misturar à realidade econômica.

O nosso fracasso em criar empregos é uma escolha, e não uma necessidade – uma escolha racionalizada por um conjunto de desculpas que está sempre mudando de forma.

Desculpa número um: há um arco-íris no céu logo ali na esquina.

Vocês se lembram dos “brotos verdes”? E do “verão da recuperação”? As autoridades do governo continuam declarando que a economia está se recuperando – e Lucy continua roubando a bola de futebol do campo. Mas as ilusões de recuperação têm sido uma desculpa para não se fazer nada enquanto a crise do desemprego aumenta.

Desculpa número dois: tenham medo do mercado de ações.

Dois anos atrás, o jornal “The Wall Street Journal” declarou que as taxas de juros da dívida dos Estados Unidos em breve disparariam, a menos que Washington deixasse de lutar contra a recessão econômica. Desde então, advertências de um ataque iminente dos “vigilantes das ações” têm sido usadas para atacar quaisquer gastos com a criação de empregos.

Mas a teoria econômica básica diz que as taxas de juros permanecerão baixas enquanto a economia estiver deprimida – e a teoria econômica básica está certa. A taxa de juros sobre títulos de dez anos era de 3,7% quando o “Wall Street Journal” fez a advertência; no final da semana passada ela estava em 3,03%.

Como foi que os suspeitos de sempre responderam? Inventando a sua própria realidade. Na semana passada, o deputado Paul Ryan, o homem responsável pelo plano do Partido Republicano para acabar com o Medicare, declarou que nós devemos acabar com os gastos do governo para “aliviarmos a pressão sobre as taxas de juros” - a mesma pressão, suponho eu, que empurrou essas taxas para um patamar tão baixo que se constitui quase em um recorde.

Desculpa número três: a culpa é dos trabalhadores.

O desemprego disparou durante a crise financeira e no período que a ela se seguiu. Assim, parece bizarro argumentar que o problema real está nos trabalhadores – que os milhões de norte-americanos que estavam trabalhando quatro anos atrás mas que agora não estão carecem, de alguma forma, das qualificações das quais a economia necessita.

Mas é isso o que se ouve de vários especialistas nos dias de hoje: o desemprego elevado é “estrutural”, dizem eles, e exige soluções de longo prazo (o que, na prática, significa não fazer nada).

Bem, se existisse de fato uma discrepância entre os trabalhadores que nós possuímos e aqueles dos quais necessitamos, os trabalhadores que contassem com as qualificações certas, e que fossem portanto capazes de encontrar empregos, deveriam estar recebendo salários maiores. Mas eles não estão. Na verdade, os salários médios caíram no mês passado.

Desculpa número quatro: nós tentamos estimular a economia, mas a tentativa não deu resultado.

Todo mundo sabe que o presidente Barack Obama tentou estimular a economia com um aumento enorme dos gastos do governo, e que isso não funcionou. Mas isso que todo mundo sabe não é a verdade.

Pensem só: onde estão os grandes projetos de obras públicas? Onde estão os exércitos de funcionários do governo? Atualmente há na verdade meio milhão de funcionários do governo a menos do que quando Obama assumiu a presidência.

Sendo assim, o que aconteceu com o estímulo? Grande parte dele consistiu de cortes de impostos, e não de aumento de gastos. E a maior parte do restante consistiu de auxílio a famílias em dificuldades ou a Estados e municípios que enfrentavam problemas sérios. Esse auxílio pode ter amenizado a crise, mas ele não foi aquele tipo de programa de geração de empregos do qual nós precisávamos e que deveríamos ter implementado. Não estou fazendo aqui uma análise fácil do passado: alguns indivíduos advertiram desde o início que os cortes de impostos seriam inefetivos e que os gastos propostos eram terrivelmente inadequados. E os fatos mostraram que eles tinham razão.

Vale a pena observar que em uma outra área na qual o governo poderia fazer uma grande diferença – ajuda aos donos de imóveis que estão em dificuldades – quase nada foi feito. O programa de alívio de hipotecas do governo Obama não chegou a lugar algum: dos US$ 46 bilhões alocados para ajudar famílias a permanecer em suas casas, menos de US$ 2 bilhões foram de fato dispendidos.

Resumindo, a economia não está consertando a si própria. E tampouco existem obstáculos reais a ações do governo: tanto os vigilantes das ações quanto o desemprego estrutural só existem na imaginação dos especialistas. E se o estímulo econômico parece ter fracassado, isso ocorreu porque nunca se tentou de fato implementá-lo.

Quem escutar o que pessoas supostamente sérias dizem a respeito da economia acreditará que o problema é: “não, nós não podemos”. Mas a realidade é: “não, nós não faremos”. E todo especialista que reforça tal mensagem é parte do problema.


Paul Krugman
Paul Krugman é professor de Princeton e colunista do New York Times desde 1999; Krugman recebeu o prêmio Nobel de economia em 2008
 enviado por MVM <==> News
Artigo original, em inglês, em: No, We Can’t? Or Won’t?
Esta tradução está na Folha de São Paulo

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