segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

OS DIREITOS HUMANOS E A PRESIDENTE

Laerte Braga

É compreensível que Dilma Rousseff queira uma posição clara e definida do Brasil sobre direitos humanos em todo o mundo. Deve querer inclusive no Brasil. A abertura dos arquivos da ditadura militar. Ela própria vítima da boçalidade dos “patriotas” e “redentores” da pátria.

Por outro lado é incompreensível que a iraniana tenha sido condenada a morte por crime de adultério e co-autoria na morte do marido. Que a pena de morte se materialize num apedrejamento é a negação do caráter libertador da revolução islâmica no Irã.

Há dias um preso foi executado num estado norte-americano com uma injeção destinada a sacrificar animais doentes. Padeceu dezoito minutos de insuficiência respiratória antes do óbito. A injeção letal estava em falta, alguns dos seus componentes e um deles o anestésico, o analgésico.

É característica de uma sociedade doentia, a dos EUA.

As instruções divulgadas pela mídia sobre a determinação da presidente ao ministro das Relações Exteriores para que não haja omissão de voto brasileiro sobre esse tema, direitos humanos, no todo, em si, soam imprecisas.

Como tratar o campo de concentração de Guantánamo? Prisioneiros sem culpa formada, seqüestrados em seus países, tratados como animais?

Ou nas prisões do Iraque durante a guerra naquele país, agora no Afeganistão e as condições bárbaras e cruéis que o estado fascista de Israel impõe a presos palestinos?

Uma das exigências do governo do conglomerado terrorista EUA/ISRAEL TERRORISMO S/A é que seus soldados e agentes não sejam submetidos ao tribunal internacional que trata do tema, podendo, assim, praticar toda a sorte de barbáries que praticam no mundo, aí está o WikiLeaks a mostrar a natureza hedionda da sociedade norte-americana.

A determinação da presidente se aplica apenas ao caso da iraniana, ou vai se estender ao terrorismo de estado dos EUA e de ISRAEL?

E ao fazê-lo dá a sensação que no governo do ex-presidente Lula o assunto era tratado com desdém, ou com omissão. Foi a ação do ex-ministro Celso Amorim que evitou que Sakineh fosse apedrejada e esteja viva até hoje.

Quando de eventuais acordos entre Brasil e EUA o governo brasileiro não aceitou a impunidade pretendida por norte-americanos para ações no Brasil, exceto aquelas previstas no direito internacional e comuns a todos os países. Os acordos não foram fechados.

A violência está inoculada no ser humano nos dias atuais. Virou de tal forma uma situação banal que não espanta ninguém, pelo contrário.

Multidões acorrem aos cinemas para assistir a oficialização do esquadrão da morte agora chamado de BOPE - Batalhão de Operações Especiais. Atua à margem da lei e acaba sendo uma versão cabocla do serviço secreto inglês na versão de Ian Fleming, naquele negócio de duplo zero. O direito de matar.

Há uma frase célebre de um policial que depois se descobriu corrupto, elegeu-se deputado por conta disso, o tal Sivuca, que “bandido bom é bandido morto”.

Que tal os direitos humanos das vitimas de Daniel Dantas nas suas trapaças?

Ou nos índios e camponeses desalojados por Ermírio de Moraes e suas empresas no afã do tal progresso? Que progresso?

O que transforma um estado inteiro, o extinto Espírito Santo em um campo de concentração de grandes grupos econômicos acobertados por autoridades e garantidos por pistoleiros oficiais e não oficiais?

É preciso explicar melhor esse negócio de não se abster, de não se omitir na questão dos direitos humanos.

Existem centenas de famílias de brasileiros esperando informações sobre o paradeiro de seus entes desaparecidos nos quartéis da ditadura. Essa atitude impositiva vai valer também para efeitos internos, ou só para estigmatizar o Irã, fechando portas à própria condição de prisioneira de Sakineh?

Na Colômbia milhares de jovens foram assassinados por paramilitares no governo de Álvaro Uribe e como fica isso, se Uribe é um dos homens de confiança de Washington em missões sobre exatamente “direitos humanos”.

O WikiLeaks jogou por terra a máscara que caracterizava a hipocrisia norte-americana sobre o assunto, como é que vai ser a posição do novo governo sobre o assunto?

No Haiti, onde em tese o Brasil tem o comando das forças de intervenção da OEA – Organização dos Estados Americanos – Cuba tem perto de 1320 agentes de saúde (médicos, paramédicos e enfermeiros) tratando haitianos vítimas do cólera e alcançando índices surpreendentes de cura num menor espaço de tempo possível. Os médicos brasileiros que lá estão puderam contatar os cubanos e conhecer o tratamento aplicado por eles. Obama proibiu os norte-americanos de fazê-lo.

É crime. É violação dos direitos humanos.

Mas, sempre o “mas”, as reservas petrolíferas na costa haitiana são imensas e vai daí que, pois é.

Registre-se que Cuba não pertence a OEA e está lá por decisão humanitária do seu governo.

A grande preocupação dos EUA hoje é exatamente a simpatia dos haitianos pelos cubanos por conta do trabalho realizado e dos resultados alcançados.

Quando em visita a Alemanha o ex-presidente Lula, na coletiva que deu junto com a chanceler Angela Merkel, ouviu da alemã que era preciso adotar medidas para pressionar o Irã e evitar que o país construísse ou venha a construir armas nucleares.

De bate pronto o presidente brasileiro respondeu assim. Que concordava, mas “é preciso que quem pede isso tenha moral para fazê-lo, ou seja, não tenha armas atômicas”. Merkel não disse nada, Lula estava se referindo aos EUA e a Alemanha é hoje colônia do conglomerado terrorista, com mais de duzentas ogivas nucleares em seu território contra um inimigo que não existe. As tais bases da OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte.

Uma palestina que protestava contra o muro construído pelo governo sionista de Israel em terras palestinas roubadas e saqueadas, foi morta em ação repressiva dos invasores sionistas. O Brasil de Dilma vai protestar contra esse fato vergonhoso? Foi no final da semana passada.

O filho de Sakineh pediu perdão pelo crime da mãe, em entrevista a jornais ocidentais (A GLOBO não fala nada, lógico, está no bolso dos donos do mundo), pediu que a mãe não seja executada. A culpa? Co-autoria no assassinato do marido.

Dois pesos e duas medidas no voto brasileiro a partir de agora?

Quando Dilma estava presa, depois de ter sido torturada, submetida a toda a sorte de humilhações pelos militares brasileiros, o embaixador dos EUA aqui dizia a Nixon, presidente do conglomerado terrorista que a “a situação dos direitos humanos no Brasil é trágica”. A resposta de Nixon foi simples – “É, mas fazer o que? O general Médici é um bom aliado nosso”.

Política da hipocrisia, do cinismo.

Ou a presidente esclarece esse trem direito, ou vai ficar a impressão que amigos podem matar a vontade e inimigos não.

Isso é cinismo. Um grande equívoco e um péssimo início no campo da política externa.

Na história dos EUA não existe, nos últimos cem anos, um único registro de governador ou presidente da República que tenha dado o perdão a um preso condenado a morte.

Bush tem o mais alto índice de condenação quando governador do Texas.

Em dois de maio de 1960 o mundo inteiro – o mundo inteiro mesmo – ficou chocado com a execução de Caryl Chessman na prisão de San Quentin, câmara de gás, depois de anos a fio lutando para ter sua pena comutada para prisão perpétua.

À porta da prisão figuras como Marlon Brando, Paul Newman, Norman Mailer, milhares de cidadãos comuns. Em várias capitais de países europeus, latino-americanos, asiáticos, africanos, manifestações contra a condenação de Chessman.

Eisenhower deu uma banana para o mundo inteiro. Chessman foi executado.

Ahmadinejad acolheu o pedido de Lula e Celso Amorim, suspendeu a execução de Sakineh por apedrejamento e mandou rever o processo. 

Mais de mil condenados aguardam execução em penitenciárias norte-americanas nos estados onde ainda existe a pena de morte.

É possível que Dilma tenha levado em consideração que ao contrário de Sakineh, os norte-americanos, mesmo os mortos por injeções destinadas a sacrificar animais doentes, têm direito a uma última refeição, um último cigarro e a extrema unção.

Deve ser por aí.  

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