quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Funcionários do GOVERNO DO BRASIL comentam o caso do refugiado suspeito de ser terrorista das FARC com a Embaixada dos EUA.


Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

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CÓPIA CORRIGIDA – ACRESCENTARAM-SE ENDEREÇOS
SIPDIS / SIPDIS

ASSUNTO: Funcionários do GOVERNO DO BRASIL comentam o caso do refugiado suspeito de ser terrorista das FARC 

1. (S/NF) RESUMO. O embaixador e conselheiros políticos fizeram contato [ref A] com altos funcionários do governo no Brasil, destacando as preocupações do governo dos EUA sobre a decisão, do dia 14/7/2006, tomada pelo Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE, MJ), de garantir status de refugiado a um suspeito de ser terrorista das FARC, Francisco Antonio Cadena Collazos (refs B and D), apesar do claro pedido de que Cadena fosse extraditado, feito pelo governo da Colômbia e da obrigação, para o Brasil, de negar paraíso seguro a terrorista, nos termos da Resolução n. 1373 do Conselho de Segurança da ONU.
O subsecretário para Assuntos Políticos Antonio de Aguiar Patriota e outros altos funcionários do Ministério de Relações Exteriores (MRE) disseram que a decisão pelo CONARE foi complexa e laboriosa, na qual pesaram muito fatores “humanitários”. Disseram que o CONARE, fortemente encorajado pelo representante do Conselho de Segurança da ONU, não considerou Cadena como “terrorista” mas como refugiado de um “conflito armado interno”, abordagem que, disseram, é a mesma que tem sido tomada consistentemente pelo CONARE nos casos de mais de 300 outros colombianos que vivem no Brasil como refugiados. 

Luiz Paulo Barreto, presidente do CONARE e funcionário de segundo escalão do Ministério da Justiça do Brasil, disse ao conselheiro político que o comitê deliberou ao longo de quase um ano (diferente dos 30 dias de discussão em outros casos de refugiados), que o processo do governo da Colômbia contra Cadena foi considerado fraco; que o timing do pedido de extradição para Cadena (que vivia no Brasil já desde 1992) foi considerado motivado por interesses da campanha eleitoral na Colômbia; e que nada encontraram na história de Cadena, mesmo depois de muita investigação, que comprovasse ser ele comandante militar das FARC, não o comissário político, sacerdote e representante político que declarou ser. Apesar de haver relatos confiáveis que demonstram o contrário, Barreto negou que tenha havido pressão política sobre o CONARE para que garantisse status e proteção de refugiada a Cadena. E disse que estaria pronto para revogar “num minuto” o status de refugiado garantido a Cadena, se (1) se constatasse alguma mentira no pedido que Cadena apresentou; (2) se Cadena não cumprisse as condições a que o status de refugiado o obriga; (3) se o Governo da Colômbia acrescentar novas informações em nova apelação ao CONARE. 

Barreto disse também que está disposto a receber e assumir pessoalmente a responsabilidade pelo sigilo de qualquer informação que a inteligência dos EUA tenha sobre Cadena e que tenha alguma relação com a solicitação de status de refugiado e com sua história com as FARC na Colômbia. FIM DO RESUMO. 
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Providências no Ministério de Relações Exteriores 
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2. (SBU) DCM (servindo como embaixador naquele momento) fez contato [ref A] com o Embaixador Antonio de Aguiar Patriota, Subsecretário para Assuntos Políticos do MRE, dia 4 de setembro. [DCM SIPDIS] destacou que a decisão do CONARE incongruente com os compromissos assumidos pelo Brasil sob a Res. n. 1.371 do Conselho de Segurança da ONU. 

Patriota pareceu não estar atualizado sobre detalhes da decisão do caso Cadena, mas disse que a questão fora discutida com o Ministro Amorim, de Relações Exteriores, e outros. Disse que, segundo o representante do MRE no CONARE, o representante do Conselho de Segurança da ONU havia pressionada muito a favor de o Brasil conceder o status de refugiado, no que fora processe extensivo e “desapaixonado” na comissão. Observou que algumas das considerações chave foram “humanitárias” – i.e., que Cadena já vivera pacificamente no Brasil por 15 anos e tem mulher e filho brasileiros. 

3. (SBU) Essa embaixada tomou uma segunda providência dia 5 de setembro junto à Secretária-assistente para Organizações Internacionais do MRE, Embaixadora Maria Luiza Veotti. Veotti estava acompanhada por Marcus Fagundes, chefe da Divisão OAS e representante alternativa do Ministério na direção do CONARE. O Embaixador enfatizou que o governo dos EUA não tem intenção de interferir nos processos legais brasileiros, mas manifestou o desagrado do governo dos EUA [orig. USG dismay] com a decisão do caso Cadena; e questionou como o Governo do Brasil enquadraria essa decisão, à vista de seus deveres nos termos da Resolução n. 1.371 do Conselho de Segurança da ONU. 

4. (SBU) Veotti enfatizou que o CONARE classificou Cadena como refugiado, não como beneficiário de asilo político. O status de refugiado é garantido unicamente e independentemente pelo CONARE, [BRASILIA 00001910 002.2 OF 003] que inclui representantes do Governo do Brasil dos ministérios da Justiça e das Relações Exteriores, além de representantes do Conselho de Segurança da ONU e ONGs de base religiosa e da sociedade civil. O asilo político é processo nacional, no qual o Governo do Brasil estaria diretamente envolvido. Mas o pedido de Cadena só se referia ao status de refugiado, e foi enviado ao CONARE. Como refugiado no Brasil, Veotti afirmou que Cadena não pode ser extraditado, e o papel do Judiciário nesse estágio é essencialmente passivo (como disse ela). Se, por qualquer razão, o CONARE revogar o status de refugiado, a extradição ainda poderá ser considerada pelos tribunais. Veotti reiterou o que Patriota dissera sobre a deliberação do CONARE (que foi laboriosa, e que as questões humanitárias emergiram como decisivas). Disse que era importante notar que o CONARE “jamais definiu ou caracterizou Cadena como terrorista,” mas, sim, como um colombiano “envolvido ou afetado pelo conflito armado interno em seu país, que temia ser morto, ferido ou perseguido; e que o CONARE seguiu a definição da ONU, de 1951, em seus procedimentos.”  É o mesmo contexto no qual o CONARE tem abordado outros pedidos feitos por colombianos, de refúgio no Brasil – acrescentou ela. [Esse embaixador] observou que visitaria o presidente do CONARE que acolheu o pedido de Cadena. E Veotti encareceu que essa Embaixada procurasse esclarecimento detalhado nessa futura reunião. 

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Com o presidente do CONARE
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5. (C) O secretário executivo do Ministério da Justiça Luiz Paulo Barreto encontrou-se com esse embaixador dia 6 de setembro para discutir o caso Cadena. Barreto, além de ser alto funcionário de carreira [como advogado] no Ministério, é presidente do CONARE e preside as seções de deliberação. Barreto é há muito tempo contato cooperativo dessa embaixada, em várias questões de aplicação da lei e de contraterrorismo. Pedindo sigilo [orig. Requesting confidentiality on our part] e rompendo o silêncio que normalmente cerca as decisões do CONARE sobre refugiados, expôs os fatores que mais pesaram na gestão do pedido de refúgio que Cadena apresentou ao CONARE:

-- Barreto disse que o comitê considerou viciado [orig. vicious], em termos legais, a alegação e o pedido de extradição apresentados pelo Governo da Colômbia contra Cadena. Observou que o suposto crime foi cometido em 1991, e que só em 2005 o Governo da Colômbia encaminhou pedido de extradição ao Brasil; disse que o caso parece depender completamente do depoimento de uma testemunha recentemente surgida, e que fontes brasileiras informam que teve sua sentença reduzida na Colômbia e recebeu compensação financeira em troca da acusação contra Cadena. 

O CONARE entrevistou Cadena longamente, e ele negou as acusações de assassinado e disse que estava na Venezuela na data do ataque de 1991 ao posto da Polícia Nacional Colombiana onde aconteceram os assassinatos. Barreto reconheceu que Cadena não tinha testemunhas que comprovassem o que dizia. -- Barreto disse que o CONARE entendeu que o interesse e o timing [das ações] do Governo da Colômbia em conseguir a extradição de Cadena estava sendo motivado por fatores da política interna da Colômbia. 

Barreto disse que Cadena já vivia no Brasil desde 1992, mas que nesse período voltou algumas vezes à Colômbia, em alguns casos com autorização do Governo da Colômbia. Barreto disse que o Governo do Brasil tinha informação oficial, confirmada pelo testemunho do próprio Cadena, de que Cadena serviu como negociador ocasional entre o Governo da Colômbia e as FARC, mais recentemente em 2000. CONARE questionou o motivo pelo qual governos colombianos anteriores deram prova de considerar Cadena inócuo e, mesmo, chegou a apoiar que participasse de negociações como facilitador, permitindo que entrasse e saísse de território colombiano, mas o governo Uribe – precisamente em ano eleitoral – decide, repentinamente, pedir que Cadena fosse extraditado. 

Barreto argumentou que as intervenções do Governo e da Embaixada da Colômbia com o CONARE, sobre o caso, virtualmente cessaram quando Uribe foi reeleito. (Comentário: É argumento vicioso, dado que Cadena recebeu o status de refugiado menos de dois meses depois da reeleição de Uribe. FIM DO COMENTÁRIO.) 

-- Barreto disse que o Governo do Brasil, inclusive os serviços militares e de inteligência, auxiliaram o CONARE durante vários meses, em “investigações exaustivas” sobre a história de Cadena na Colômbia com as FARC, e não encontraram qualquer informação que sustentasse as alegações do Governo da Colômbia, de que Cadena seria comandante militar de campanha das FARC, capaz de [BRASILIA 00001910 003.2 OF 003]liderar um ataque contra uma base militar. 

Cadena afirma que serviu às FARC como comissário político, professor e sacerdote na Colômbia; e, depois, como representante informal do grupo no Brasil, mas não como combatente, menos ainda como comandante militar. 

Barreto disse que a informação desenvolvida pelo CONARE e pelo governo do Brasil não desmente essas assertivas (disse que a única imagem que o Governo do Brasil obteve de Cadena em uniforme das FARC tem 30 anos e o mostra segurando uma Bíblia numa das mãos e uma arma na outra). -- Barreto disse que há 350 colombianos vivendo no Brasil com status de refugiados, reinstalados aqui depois de terem conseguido convencer o CONARE de que enfrentariam riscos relacionados ao conflito interno no país, se voltasse à Colômbia. Alguns foram reinstalados aqui a pedido do Governo da Colômbia; outros requereram por iniciativa própria o status de refugiados; que são egressos das fileiras das forças de segurança da Colômbia, paramilitares e guerrilheiros; e que também há cidadãos comuns. Entre eles, disse Barreto, como exemplo a ser contrastado com o caso de Cadena, há dois ex-soldados do exército colombiano que mataram comandantes das FARC em combate, aos quais o exército da Colômbia não podia garantir condições de segurança depois de desmobilizados. Observando que o CONARE analisou o caso Cadena durante nove meses – a maioria das decisões é tomada em um mês –, Barreto disse que o CONARA pesou atentamente todas as informações. No final, disse ele, concluíram que Cadena apresentou caso consistente ao CONARE, no qual demonstrou que padecia de medo justificável de que seria morto nas mãos de elementos paramilitares, se voltasse à Colômbia – argumento que se sobrepôs aos argumentos e ao pedido de extradição apresentado pelo Governo da Colômbia, que pareceram ao CONARE questionáveis em vários pontos, como acima relatado.

6. (C) Em resposta a pergunta direta desse embaixador, Barreto disse que o CONARE não sofreu pressão política de nenhuma origem, quando avaliava o caso. Acrescentou que o status de Cadena é condicionado ao pleno cumprimento dos deveres que se impõem a refugiados (i.e., nenhum ativismo político em solo brasileiro, rompimento de qualquer contato com as FARC), e que, no caso de o CONARE ter conhecimento de que Cadena mentiu em qualquer das declarações que se lêem no processo, ele [o próprio Barreto] recomendaria “num minuto” que seu status fosse revogado e que se abrisse o caminho para a extradição. Barreto disse que o CONARE está aberto a outros apelos e a novas informações, vindas do Governo da Colômbia, se houver, sobre o caso. 

Pediu que o Governo dos EUA forneça qualquer informação relevante que porventura tenha ou obtenha sobre o caso Cadena, enviando-a diretamente a Barreto, que assumia responsabilidade pessoal pelo sigilo e utilização da informação, no caso de envolver fontes e métodos de Inteligência. 

7. (S/NF) COMENTÁRIO. Os funcionários do Governo do Brasil contatados por essa embaixada, sobretudo Barreto, ofereceram explicação cogente da decisão do caso Cadena, embora, de nosso ponto de vista, não seja explicação na qual se deva particularmente confiar. Mostram entender bem os objetivos de nossas providências, foram francos, não autodefensivos, em suas reações, e tinham respostas prontas a oferecer, o que reflete processo exaustivo de decisão, conduzido dentro dos padrões que o Conselho de Segurança da ONU espera ver observados.

Nada disso altera nossa opinião inicial, de que a decisão do CONARE foi tomada sob efeito de pressão dos mais altos escalões do Governo do Brasil, e que os membros do Governo do Brasil ativos no CONARE, de fato, responderam favoravelmente àquela pressão (é nossa opinião que os membros da ONU e das ONGs sempre estarão abertos nessa direção, em qualquer evento). 

Isso dito, se o Governo da Colômbia estiver preparado para lutar contra a decisão do CONARE, terá de construir e desenvolver caso judicial-legal o mais sólido, o mais detalhado possível contra Cadena, concentrando-se nas acusações específicas relacionadas ao comando do ataque à base da Polícia Nacional Colombiana em 1991 e nas duas mortes lá ocorridas. Nessa direção, qualquer informação que o Governo da Colômbia ou o Governo dos EUA consigam obter sobre a história de Cadena nas ações militares das FARC também será útil. [Assina: SOBEL]

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