sábado, 15 de janeiro de 2011

CATÁSTROFES E O MEDO DE DIZER NÃO!

José Flávio Abelha

A primeira catástrofe que presenciei foi em Caratinga/MG, nos anos 40, quando a natureza enfurecida alagou o bairro onde eu morava, destruiu casas, as famílias usando as janelas para pular nas carroças e a água crescendo misteriosamente na rua, sob um céu azul. Dos bueiros jatos de água inundavam nosso bairro, o Barro Branco.

Uma tragédia. O socorro comandado pessoalmente pelo prefeito municipal, José Augusto Ferreira Filho.

O famoso Doutor Zé Augusto, montado em um mulão, já com os pés arrastando na água, gritava para o povo, comandava o resgate das pessoas. Não havia helicóptero, TV, nada. Só a presença do alcaide.

Prefeito José Augusto Ferreira Fo.
Mais tarde vi uma fotografia de um incidente na construção do complexo da Pampulha e lá estava Juscelino também montado em um mulão comandando os reparos. Uma prévia do que mais tarde JK faria na construção de Brasília com as suas incertas noturnas depois do expediente no Catete, voando em um avião caindo aos pedaços. Depois vieram os dois Vickers Viscount 701.(Eu disse dois aviões, iguais ao da Rainha da Inglaterra. Um escândalo).

Bons mineiros, esses administradores sabiam que o olho do dono engorda o boi.

Também na maior enchente do Arrudas, em Belo Horizonte, lá estava Hélio Garcia, de capa de plástico e botas de borracha, na lama, comandando os serviços necessários para que a catástrofe não fosse maior.

Naquele dia Hélio Garcia disse um solene NÃO ao Arrudas. O chamado ribeirão não mais iria inundar boa parte da cidade e teve início a sua canalização.

Aprendi em Minas que é a presença do administrador o maior impulso para que uma obra seja feita com a urgência necessária. Nunca um mineiro pensou que a sua presença iria atrapalhar o serviço, como aconteceu, recentemente, na tragédia niteroiense do Bumba.

Estamos presenciando agora a maior tragédia nacional que é a destruição de bairros e cidades da região serrana, uma das mais belas do Brasil.

Globo
A Vênus Platinada assenhoreou-se da tragédia. Repetições e mais repetições de cenas lamentáveis. Close de gente chorando, expertos explicando o fenômeno. Ninguém, mas ninguém mesmo, com a coragem de colocar o dedo na ferida:

- O medo dos administradores de dizer NÃO!

NÃO aos pobres habitantes dependurados nos morros ou nas beiras dos córregos espremidos entre duas montanhas. NÃO aos ricos que, por exibição, construíram suas mansões nas mesmas condições dos pobres, nos morros ou nas beiradas dos córregos.

O NÃO aos pobres é doloroso, requer uma solução de moradia segura, transporte, qualidade de vida etc. E isso custa caro, mas o desgaste maior é o eleitoral. Ao se fazer vista grossa a essa desordenada invasão pelos deserdados da sorte, cria-se um curral eleitoral garantido. Mais tarde, quando a natureza chega cobrando o que é seu, sobrevoa-se a área destruída, contam-se os mortos, anunciam-se providências e nunca é demais lembrar que “em fevê tem carná”, a Copa vai ser aqui, assim como as Olimpíadas.

Quando os senhores administradores deixarem na garagem os carrões oficiais e se perderem na multidão, incógnitos, mas atentos aos problemas do município, o NÃO vai ser dado.

Grimpa de morro
Aqueles barracos dependurados nas grimpas de morros que se derretem no primeiro temporal só podem ser vistos se o administrador perambular pelo município, caminhando ou de ônibus superlotado.

Ao chegar ao seu local de trabalho, o doloroso NÃO! Isso não pode continuar.

Vamos retirar esse povo desses precipícios. De hoje em diante, nenhum barraco será mais construído nos locais perigosos. Os que já estão prontos, serão derrubados e nos locais, um reflorestamento. Os habitantes pobres transferidos para casas populares, com dignidade, com transporte, serviço de saúde, educação, ou seja, moradias que proporcionem um mínimo de dignidade aos que não podem construir mansões.

E dizer NÃO aos bafejados pela sorte, quando requererem, se requererem, alvarás para construção nos morros e nas beiras dos rios.

Mais tarde, de NÃO em NÃO, os deserdados vão descobrir que se libertaram do curral eleitoral e, beneficiados, vão votar em quem os beneficiou. Os ricos, ah! os ricos, esses se beneficiam de liminares e das doações para o caixa dois eleitoral e constroem suas mansões sub judice, cujo deslinde judiciário vai rumo às calendas gregas.

De uma coisa os administradores sabem; na catástrofe os ricos não vão reclamar cestas básicas, salário-aluguel e outros benefícios.

E que os planejadores mequetrefes, geólogos de gabinete, ONG's não sei das quantas, saiam do caminho ou, no máximo, deixem de arrotar frases feitas e bobagens que todo mundo já sabe. Não atrapalhem na base do palpite, o que já é uma grande colaboração.

E todos parem de culpar El Niño, La Niña, efeito estufa e aquecimento global.

O tal buraco na camada de ozônio (acho que é isso mesmo) já caiu em desuso.

A solução é simples. Chuvarada, sempre vai ter. Mas, antes dela, que venha o NÃO! NÃO PODE!

E, por favor, deixem os carrões pretos nas garagens e andem pelas ruas no meio dos eleitores. Ouçam a voz do povo, do Zé povinho que entende mais das coisas do que esse amontoamento de expertos, muito espertos, e reparem nas encostas e nos ribeirões.

Onde anda a tolerância ZERO?

Ela não “anda”. O judiciário não deixa.


enviado pelo autor: José Flávio Abelha

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.