domingo, 8 de agosto de 2010

Tem moral para censurar o Irã quem silencia diante do genocídio dos palestinos?

Por que não falam do arsenal atômico de Israel com mais de 220 ogivas nucleares?


"A devastação de Gaza pelos israelenses,

contra uma população civil cercada - e

usando bombas, dinheiro e cobertura

diplomática dos EUA - foi tão brutal e

horrenda que mudou para sempre o modo

como o mundo vê o conflito no Oriente Médio"

Glenn Greenwald, blogueiro de Salon.com,

durante o massacre de Gaza, sobre o qual

José Serra não esboçou um só lamento.




Para essas crianças vítimas dos ataques de Israel, Serra silencia. Ao lado, Mordechai Vanunu, físico israelense que documentou o arsenal atômico sionista.

Cearense, fosse fanático do Padre Cícero estaria me impondo uma sova de chicotadas por ter acreditado, nalgumas noites de verão, que José Serra seria uma alternativa aos meus temores sobre os destinos do Brasil.

Não me caberia outra forma de autocrítica porque já não sou mais criança e me considero, ao contrário, razoavelmente informado.

Mas quis este tempo de frescor agradável que o próprio Serra se encarregasse de mostrar-se e as suas entranhas na emblemática demonstração do mais explícito comprometimento com o que há de pior neste mundo hegemonizado por interesses espúrios e ameaçadores.

Hoje, no espelho de um agosto revelador, sou forçado a penitenciar-me para dizer, ainda a tempo e hora, que Serra também é um rendido ao que há de pior na atmosfera e não se peja em repetir os velhos scripts da hipocrisia mais obscurantista.

Sem olhos para o massacre de Gaza

Leva-me a esta deprimente conclusão sua insistência em alardear identificação com os direitos humanos para chacoalhar o relacionamento soberano e lúcido do governo brasileiro com alguns países amaldiçoados pela potência decadente e estigmatizados pela calculista beligerância sionista.

De fato, não há nada mais falso e mais indecente do que essa peroração. Ou terá autoridade para reclamar de qualquer coisa quem silencia ante o genocídio continuado do Estado de Israel contra o povo palestino? Que indignação esboçou Serra naquele 27 de dezembro de 2008, quando centenas de bombas letais israelenses afogaram Gaza numa imensa poça de sangue, deixando um rastro de 1400 mortos, entre tantos, 400 crianças e adolescentes menores de 14 anos?

Ou aos olhos do ex-presidente da UNE os palestinos, que já foram esbulhados em suas terras, já não têm direito sequer a viver no que lhes deixaram de sobra? Nem mesmo no impiedoso ataque a um navio com ajuda humanitária aos famélicos de Gaza no último 31 de maio, quando tropas israelenses fuzilaram 9 voluntários a bordo, o Serra que se jacta de defensor dos direitos humanos deu um único pio.

Catilinária sob encomenda
Não acho que o regime do Irã é intocável. Governos teocráticos, em geral, tendem a misturar políticas de Estado com dogmas religiosos. Mas as críticas que sofre são tergiversadoras e emanam de outra matriz: é a sua pujança - a possibilidade de emergir no Oriente Médio como uma nação forte que assusta e move a campanha orquestrada para abatê-lo, mesmo à custa de uma catástrofe nuclear sem precedentes.

Por que Serra escolheu o Irã para saco de pancadas? Como já disse, não o motiva a catilinária de uma falsa indignação. Investigando melhor, fui ter com as íntimas relações do candidato tucano com o banqueiro Joseph Safra e a malha sionista que controla as finanças daqui e d'além mar. É desse bolsão de poderosos argentários que brota a sua inspiração. Outra fonte não há.

Tanto que o mesmo Serra não deu um pio quando da divulgação das fotos das torturas infligidas pelos norte-americanos aos iraquianos na prisão de Abu Ghraib, nem tampouco chiou contra a utilização da base naval de Guantánamo, em território cubano, que os EUA detêm pela força, como centro de torturas de iraquianos e afegãos.

Combustível para a guerra

E não é para menos. O sionismo anda ouriçado na articulação de uma ofensiva militar contra o Irã, único remédio prescrito por Israel como forma de "evitar um ataque futuro dos Iranianos".

Há uma convergência de intenções entre os militares de Israel e dos Estados Unidos, estes ainda atordoados com a repercussão da crise econômica que está longe de superada. Para ter um suporte a tal agressão, admitida como possível pelo almirante Michael Mullen, chefe do Estado Maior norte-americano, e como próxima pelo general Michael Heiden, ex-diretor da CIA, faz-se necessária indispor os povos dos outros países contra o Irã, valendo-se de todo e qualquer pretexto.

O principal deles é a idéia de que o Irã, com grandes reservas de areias monazíticas, evoluirá inevitavelmente para a produção de sua bomba atômica. Estamos diante de outra hipocrisia grosseira: por que esses críticos nada dizem das 220 ogivas nucleares de Israel, nada falam sobre o arsenal atômico de Dimona, no sul do deserto de Negev?

Em Jerusalém, corre que Israel chamará para si o início de uma ação militar contra o Irã. O ex-chefe da Mossad, Shabtai Shavit, afirmou recentemente que seu país não ficará esperando permissão dos Estados Unidos para atacar as instalações nucleares do Irã. Sobre a intenção de atacar, o governo já consultou até o general reformado Aviam Sela, responsável o ataque aéreo de surpresa contra o reator nuclear iraquiano há 27 anos.

Para os israelenses, o governo Obama não tem pressa de usar sua força militar contra o Irã. "As autoridades dos Estados Unidos preferem conduzir guerra psicológica, a qual bem poderá também ser o começo de uma guerra real".

Em plena campanha eleitoral, José Serra formula seu alinhamento ostensivo e incondicional aos beligerantes de Israel e dos EUA, o que mostra uma espécie de imatura senilidade, na afoiteza típica de quem não tem escrúpulos na caça a toda e qualquer ajuda à sua pretensão obsessiva.

À cata de ajuda financeira

É provável que Serra tenha desbundado de vez ante a constatação de que o sistema financeiro está mais para Dilma do que para ele, conforme constatou Raymond Colitt, da agência britânica Reuters, em correspondência postada de Brasília no último dia 31. Em sua matéria, o analista citou Tony Volpon, chefe de pesquisa de mercados emergentes da Nomura Securities em Nova York, que teria admitido: "O sistema financeiro secretamente prefere a Dilma".

De fato, essa preferência pela continuidade da política econômica de Lula se reflete na minguada arrecadação de grana para a campanha tucana: com R$ 3,6 milhões amealhados até agora, Serra beliscou menos do que Dilma (R$ 11,6 milhões) e que a própria Marina (R$ 4,65 milhões). Menos até que o candidato a governador do Estado do Rio, Sérgio Cabral (R$ 4,7 milhões).

É muito triste, porém, que, diante de um quadro financeiramente "desfavorável", o candidato do PSDB-DEM-PPS tenha perdido o rebolado e o recato, apelando com acenos de uma política externa ao gosto dos grandes conglomerados bélicos.

Com tal expediente, vai continuar deslizando e fortalecendo a candidata noviça, que tem a seu favor a tendência eleitoralmente conservadora dos brasileiros. E deixando a oposição sem discurso plausível: ao contrário, exibe a tosca imagem de que se comprometeu até a medula com a volta ao passado de um alinhamento automático com os projetos de um Pentágono a serviço da indústria bélica, ainda poderosa na potência decadente. Alinhamento que já não interessa a um país emergente com inevitáveis aspirações internacionais e só serve para miniaturizar a figura de um chefe de Estado.

artigo escrito e distribuído por Pedro Porfírio